Joan Hohl [ Homens Sedutores 2 ] - Impossível esquecer


  
   



 Impossível esquecer
  Gone Fishing
  Joan Hohl
  Homens sedutores 2
  
   Quando se viram pela primeira vez, Alexander e Carolyn se apaixonaram à primeira vista e em uma semana já estavam casados. Mas a promessa de amor eterno de Alexander durou menos de um ano, e os dois se divorciaram. Agora, treze anos depois, ele reaparece subitamente na vida de Carolyn, tentando reconquistar o coração da única mulher que realmente amou. Não seria tarde demais?
  
  
  
  
  
  
  
  
  
   I
  
   — Eu vou pescar.
   — Como?!
   Alexander Forrester conteve o riso diante da expressão de incredulidade de seu assistente.
   — Vou pescar — repetiu ele.
   — Bem... foi o que imaginei ter ouvido. Então, achei que só podia ser um mal-entendido.
   Alex estava se divertindo muito com a situação e caiu na gargalhada.
   — Não ouviu mal nem entendeu errado, Josh. Eu disse que vou pescar, e são exatamente esses os meus planos.
   — Mas... como... — Josh encarou seu chefe com um olhar de total incompreensão. — Eu nunca tive a menor ideia de que você gostasse desse tipo de entretenimento!
   Não era difícil compreender a reação de surpresa do rapaz. Nos últimos quatorze anos, Alex nunca fora pescar, nem mesmo tirara férias prolongadas,deixando o escritório apenas em raros fins de semana, e, durante mais da metade desse período, Josh trabalhara com a mesma assiduidade junto do patrão.
   — Na verdade, faz muito tempo que não pesco, mas gosto do esporte... principalmente de pescarias em alto-mar.
   — Ah! — Josh ainda não se recuperara do choque. — Então, pretende ir para algum lugar de clima quente?
   — Não — respondeu Alex, ainda rindo.
   Afinal, a conclusão de Josh era mais do que compreensível. Embora já estivessem no começo de junho, a temperatura ainda continuava muito baixa. Uma frente fria vinda do norte provocara essa queda na temperatura, que mais parecia a do início da primavera, e não a das vésperas do verão. Sem dúvida, época errada para pescar nas águas gélidas do Atlântico.
   — Eu não entendo... — insistiu Josh, balançando a cabeça, confuso. — Por que você iria agora...
   — Existe um certo lugar na costa leste que eu quero muito visitar — interrompeu-o Alex. — Fica em South Jersey, e não vou até lá há muitos anos.
   — Entendo...
   Mais uma vez, Alex sorriu. Certamente, Josh perguntava a si mesmo por que seu patrão não adiava a viagem por algumas semanas, quando a temperatura estaria muito mais quente, segundo os boletins meteorológicos. Pescar durante o auge de uma frente fria era o tipo de programa que não atraía a maioria das pessoas!
   Mas Alex se considerava uma exceção. Afinal, seu objetivo não era deitar-se em uma praia e ficar derretendo debaixo do sol quente.
   — Tenho meus motivos particulares. — O tom ríspido e a menção de levantar-se da cadeira indicaram que o assunto estava -encerrado. — Como só virei trabalhar até sexta-feira, preciso tomar algumas decisões e discuti-las com você.
   No sábado de manhã, após enfrentar o trânsito congestionado de início de fim de semana, na Filadélfia, Alex pôde finalmente afastar parte da tensão. Mais relaxado, deu-se ao luxo de refletir sobre os motivos dessa inédita decisão de tirar férias de verdade, distanciando-se do escritório e dos negócios, o que não acontecia havia quatorze anos.
   Em uma análise superficial, ele estava muito cansado, quase exausto. Entretanto, existia uma motivação mais profunda e bastante grave. Sentia medo de um esgotamento total.
   Alex nunca enfrentara bem a emoção do medo, sempre fora incapaz de aceitá-la como parte da vida. Acreditava piamente que o temor era debilitante e que, nas raras ocasiões era que se manifestava, uma pessoa inteligente o enfrentava, vencia e seguia adiante.
   Então, apesar dos assuntos prementes que se amontoavam em cima de sua escrivaninha, ele decidira seguir sua filosofia de vida. Por esse motivo, precisava viajar até a costa leste afim de enfrentar e de vencer não apenas seu medo de um esgotamento profissional, mas também uma enorme quantidade de outros temores, mais antigos, arraigados e pessoais que já não conseguia abafar e ignorar.
   Com um sorriso amarelo, Alex admitiu a si mesmo que a escolha do local para suas férias não tinha nada a ver com pescarias.
   Na verdade, ele gostava de pescar, pelo menos tinha sido um passatempo que considerara agradável em sua juventude, e pretendia se dedicar a esse esporte, mesmo nas águas gélidas do Atlântico Norte. Entretanto, seu objetivo primordial era relembrar seu passado, um período especial e já distante, com esperanças de exorcizar os fantasmas que o atormentavam, insistindo em permanecer vivos em sua memória.
   Alex decidira que já não podia mais adiar o momento de retornar a Cape May, em Nova Jersey. Já era mais do que tempo de ir até lá!
   Ele visitara Cape May inúmeras vezes durante a adolescência e os anos em que frequentava a universidade. Entretanto, uma ida em particular mudara toda sua vida.
   Seus lábios se comprimiram, demonstrando a tensão que o dominava. Na verdade, aquela viagem ocorrida quatorze anos atrás não fora realizada por vontade sua, e sim resultado de influências externas. Dirigira-se, com extrema relutância, para aquele local de veraneio a pedido de seu amigo Mike Peterson. Na época, Alex já havia iniciado seu caminho na estrada que o levaria a seu objetivo único: o sucesso profissional. Superara muitos dos obstáculos e não tinha tempo nem paciência para desperdiçar em dias de folga, algo que considerava uma auto-indulgência prejudicial. A concorrência nos negócios era feroz, e ele não queria afastar-se da arena e perder seu ritmo obsessivo de trabalho. Entretanto, Alex não se sentia capaz de recusar ou de ignorar o pedido do amigo. Mike ia se casar e queria que ele fosse o padrinho.
   Alex e Mike eram amigos de infância. Cresceram juntos, participaram dos mesmos times esportivos, frequentaram a mesma universidade e costumavam sair juntos, com suas namoradas. Os pais de ambos também haviam sido muito ligados, e as duas famílias passavam as férias de inverno na Filadélfia, na ampla casa dos pais de Alex, e as de verão em Cape May, na mansão vitoriana dos Peterson.
   A recordação daquele período de alegria e despreocupação o levou a não negar o pedido de Mike de não apenas estar presente ao casamento, mas também de passar com ele a semana que o antecederia.
   O resultado fora um período de férias de duas semanas. Alex passara os primeiros sete dias na casa do amigo, e eram os sete restantes que tentara arduamente esquecer.
   Com o canto dos olhos, ele avistou a placa verde e branca, indicando a saída da auto-estrada de Atlantic City para a Garden State Parkway, em direção ao sul.
   Estava quase chegando, e a tensão aumentou. Seu estômago se contraiu ao subir o viaduto que dava acesso à estrada para Cape May, a apenas alguns quilômetros da tão lembrada casa de praia de seu amigo.
   A cada placa indicando lugarejos próximos, Alex sentia a tensão crescer, enquanto tentava evitar que as lembranças viessem à tona. As agradáveis recordações de reuniões familiares e brincadeiras com os amigos eram sempre abafadas por uma onda de cenas vividas em sua última visita à mansão vitoriana dos Peterson.
   Suas mãos seguravam a direção com uma força desnecessária, e o suor cobria-lhe a testa. Um nervosismo crescente o envolvia à medida que se aproximava do local.
   Ao avistar a placa de entrada para Cape May, Alex forçou-se a continuar, embora seu instinto de proteção o alertasse a virar o carro, voltar atrás e esquecer tudo.
   Esquecer. Sem dúvida, era um bom conselho para dar a si mesmo! Enquanto fazia a curva para entrar na alameda com árvores frondosas que conhecia tão bem, Alex lembrava-se do esforço feito para apagar da mente aquele capítulo de sua vida. Ele tentara e muito, com toda a força interior que possuía.
   E como se tem sucesso na dura tarefa de esquecer completamente o evento mais significativo, emocionante e devastador de uma existência?
   Com o canto dos olhos, Alex via de relance as construções que ladeavam a avenida até seus olhos encontrarem a grade de ferro trabalhado, cercando o jardim e a casa de madeira bem distante da rua.
   A simples visão daquela casa provocou uma avalanche de recordações, que invadiram sua mente, derrubando as barreiras tão cuidadosamente erguidas por ele para proteger-se do passado. Ela se chamava Carolyn Cole...
   Em uma fração de segundo, Alex teve a impressão de ouvir o riso doce, de ver o brilho provocador dos olhos muito verdes, de sentir o perfume único de feminilidade ainda inconsciente de seu poder e de saborear o gosto inebriante da boca tentadora e sensual. Só que, há quatorze anos, ela ainda estava longe de ser uma mulher, Era apenas uma garota imatura que se escondia atrás de um corpo pronto para o amor.
   Com uma expressão de crescente tensão, ele parou o carro diante da casa. Sem abrir a porta, respirou fundo a fim de afastar a estranha sensação de estar vendo de novo o local que quase provocara sua destruição.
   Mas as lembranças eram fortes demais e o arrastaram para o dia em que a vira pela primeira vez.
   Alex chegara irritado e tenso na mansão vitoriana de seu amigo. Não apenas tivera de largar vários negócios sem terminar como também iria perder diversas reuniões importantes... Uma situação que considerava inaceitável.
   O casamento de Mike não poderia ter vindo em pior hora para ele, embora sua vida profissional fosse tão absorvente que nunca lhe sobrava sequer um minuto para indulgências pessoais.
   Apesar de todos os problemas, tinha concordado em ser padrinho de Mike e, como se não bastasse, em passar a semana inteira em Cape May. Entretanto, sua aceitação não significava que fosse se divertir com essas férias forçadas.
   Ao chegar, num sábado de manhã, ele estava de péssimo humor e decidido a detestar aquela estada na casa do amigo. Faltavam exatamente sete dias para o casamento, e sua determinação foi testada pela primeira pessoa que encontrou.
   Ela estava em uma cadeira de vime, sentada sobre as próprias pernas, numa atitude infantil. A sombra do telhado do terraço o impedia de ver bem o rosto da garota, mas sentia seu olhar examinando-o da cabeça aos pés.
   — Você é Alexander.
   Ele parou, afetado pelo som encantador daquela voz.
   —  Sou... — respondeu Alex, surpreso com a reação de seu corpo.
   Seu pulso estava rápido demais, o coração batia mais forte e... tudo fora causado apenas por causa da voz de uma desconhecida?
   Era absolutamente ridículo!
   Decidido a se convencer de que não se afetara, Alex subiu os degraus do terraço e parou diante da garota, a fim de observá-la melhor.
   — Você tem a vantagem de estar mais informada do que eu. Ele passou os olhos pelos cabelos longos, de um castanho com reflexos cor de cobre, pelos olhos verdes como esmeraldas e examinou mais lentamente o corpo esguio, mas com curvas provocantes nos lugares certos. A saia curta revelava pernas longas e douradas pelo sol.
   — Fica aborrecido por estar em desvantagem? — perguntou a garota, com uma expressão maliciosa. — Não acredito. Você é do tipo que não perde a pose por nada!
   — Realmente, não costumo perdê-la, mas, no momento, sinto-me em desvantagem. Sabe quem sou, e eu não tenho a menor ideia de quem você possa ser.
   Alex encostou-se em um dos pilares do terraço numa atitude falsamente descontraída. Sua tensão crescera diante do sorriso provocante da garota, que o fitava como se realmente o conhecesse.
   — Eu sou uma das melhores amigas da noiva e sua dama de honra. Meu nome é Carolyn Cole, mas costumam me chamar de C.C..
   —  Pois eu prefiro Carolyn, ou melhor... Carol. — Ele se surpreendeu por demonstrar um interesse tão intenso pelo nome de uma desconhecida.
   — E eu prefiro Alexander, apesar de seus amigos o chamarem de Alex.
   — E por quê?
   —  Ora! Porque combina mais com você... ou seja, com a imagem que seus amigos me transmitiram a seu respeito.
   Embora não soubesse se o comentário da garota era elogioso ou depreciativo, Alex sentiu-se lisonjeado.
   — Meus amigos andaram falando sobre mim? — perguntou ele, querendo saber de que forma era visto pela garota.
   —  Sim, e muito! Tive a impressão de que o respeitam de mais... quase a ponto de sentir um certo medo.
   — E você não concorda com a reação deles?
   — Claro que sim! — Ela o fitou, fingindo estar extremamente impressionada. — Mas acho que, em vez de medo ou respeito, sinto-me em estado de choque!
   Alex forçou-se a voltar ao presente e a penosa realidade de que, naquela época, Carol vivia no mundo de fantasias de uma adolescente.
   Recuperando o controle, viu uma placa diante da casa dos Peterson. Ao olhar pela janela do carro, ficou abismado ao se dar conta de que a bela mansão vitoriana fora transformada em uma pensão!
   E quando isso teria acontecido? Por que a família Peterson se conformaria em abrir sua casa para pessoas estranhas? Ainda seriam os proprietários, ou a mansão já passara para as mãos de um novo dono em algum momento dos últimos quatorze anos?
   Esse fato o levou a se recriminar pela indesculpável negligência. Há quantos anos não mantinha o menor contato com Mike ou com sua família? Com remorsos, admitiu que deixara de se comunicar com o amigo cerca de um ano após o casamento dele.
   Curioso, saiu do carro a fim de descobrir o que acontecera com a casa. Percorrendo um caminho familiar demais, cruzou o amplo jardim e, depois de subir os degraus do terraço, tocou a campainha.
   Ele não teve de esperar. A porta foi aberta imediatamente, e Alex viu-se diante de uma encantadora menina de dez ou doze anos.
   — Mamãe! — Ao vê-lo parado à porta, a garotinha não escondeu o entusiasmo. — Venha depressa! Temos um hóspede!
  
   II
  
   O entusiasmo da menina era tão contagiante que Alex não conteve o riso.
   — Olá! — Ela o encarou, com os olhos brilhando de alegria.
   —  Como vai?
   Na verdade, ele se sentia agradavelmente surpreso diante da exuberância daquela menina. Nos últimos anos, tinha a impressão de que todos os adolescentes já estavam entediados e mal-humorados antes de começar os melhores anos de suas vidas.
   Concentrado em observar o rosto franco e sem dissimulação da menina, ele não se deu conta de que mais alguém se aproximava da porta. Entretanto, ouviu uma sufocada exclamação de susto.
   Ao erguer os olhos, Alex também mal disfarçou o choque. Imóvel, permaneceu com o olhar fixo na mulher que se detivera atrás da menina, com uma expressão de completa incredulidade no rosto delicado. Porque ela era agora uma mulher madura e muito mais linda do que a garota de dezoito anos de seu passado.
   — Carol?
   — Alexander?
   Por um momento, Alex só conseguia pensar se seu rosto também teria ficado tão pálido quanto o dela. Ambos estavam completamente chocados e sentiam-se incapazes de desviar o olhar um do outro.
   —  Ei! Vocês se conhecem?
   Apesar do comentário ter sido em voz baixa, as palavras da garota soaram como o estrondo de um canhão aos ouvidos de Alex. Talvez o efeito sentido por Carolyn não fosse diferente, pois ambos se sobressaltaram, assustados.
   — Não... Bem, sim...
   —  Nós nos conhecemos há muito tempo — explicou Alex, salvando Carolyn de uma situação embaraçosa.
   —  Fantástico!
   A menina olhava alternadamente para um e para o outro, sorrindo com toda a inocência.
   Alex precisou esforçar-se muito para retribuir o sorriso da garota.
   — Está procurando um quarto, certo?
   A pergunta da menina assustou os dois e, aparentemente, devolveu a voz à mulher que a segurou pelos ombros.
   — Não!
   — Eu... bem, na verdade, estou...
   Ele ainda não se recuperara do choque de reencontrar Carol e não conseguia raciocinar com clareza.
   —  Oh... acho que ouvi a alarme do forno... pode ir até a cozinha desligá-lo para mim, Jess?
   — Ah, mamãe! Tenho mesmo de ir?
   — Sim.
   Contrariada, a menina ainda encarou Alex antes de se dirigir para a cozinha sem nenhuma pressa.
   — Mas eu vou voltar logo!
   Além do choque daquele encontro inesperado, Alex tentava se reconciliar com o fato de que a menina era filha de Carolyn.
   —  Sinto muito, mas não posso lhe oferecer um quarto.
   — Não me lembro de ter pedido um — disse ele, subitamente irritado. — Entretanto, por que não pode? A placa no jardim diz que há quartos para alugar.
   —  Eu ainda não abri para a temporada — respondeu ela, com uma rapidez suspeita. — Estou... terminando de preparar os quartos e só abrirei no primeiro dia do verão.
   — Entendo.
   Na verdade, Alex compreendia bem demais aquela rejeição mal disfarçada. Ela lhe recusaria um quarto mesmo se a pensão já estivesse funcionando e todos os aposentos continuassem vazios!
   — Todos os outros hotéis da cidade já estão abertos — disse ela, começando a fechar a porta.
   — Muito obrigado. Encontrarei onde ficar.
   — Tenho certeza de que sim. Adeus, Alexander.
   — Adeus, Carolyn.
   Ele já estava descendo a escada do terraço quando ouviu uma voz juvenil chamá-lo da porta.
   — Ei, moço! Para onde vai?
   Alex virou-se para a menina e disse o nome do maior hotel  da cidade.
   — Mas...
   Ele viu Carolyn franzir a testa e murmurar algo no ouvido da menina.
   —  Vejo você por aí! — gritou a garotinha, enquanto ele abria o portão.
   —  Certo — respondeu ele, com uma expressão sombria e sem olhar para trás.
   — Por que ele não quis ficar aqui, mamãe? Temos quartos de sobra... aliás, todos estão vazios!
   Jess não disfarçava a contrariedade diante da atitude irracional da mãe, que devia tê-lo convencido a ficar.
   — Talvez ele quisesse um quarto com vista para o mar — respondeu Carolyn, fugindo do assunto.
   — Mas isso não faz nenhum sentido! Se ele não pretendia se hospedar em nossa pensão, por que tocou a campainha?
   Carolyn suspirou, desanimada.
   — Por favor, esqueça isso, Jess. Não é importante.
   — Mas...
   —  Importante é a bagunça que você deixou na mesa de jantar — prosseguiu Carolyn, como se a filha não a houvesse interrompido. — Pare de discutir à toa e vá arrumar tudo.
   — Bagunça?! — exclamou a menina, visivelmente ofendida. — É minha coleção de conchas!
   — No momento, sua coleção está toda espalhada pela sala de jantar, e gostaria muito que você a guardasse. Eu ficaria embaraçada se tivesse de mostrar a casa para algum hóspede em potencial.
   — E eu gostaria muito que você não chamasse minha coleção de bagunça!
   Um sorriso suavizou as feições tensas de Carolyn, mas desapareceu tão logo Jess foi para a sala de jantar.
   Alexander...
   Ela estremeceu ao lembrar-se da figura arrogante parada em seu terraço. Com quantos anos ele estaria agora? Irritada, repreendeu a si mesma. Sabia exatamente qual era a idade de Alexander, que faria quarenta anos no dia doze de julho.
   Alto, musculoso e de cabelos loiro-acinzentados, Alex não parecia ter nem trinta anos. Com a mania moderna de se manter jovem e cultuar o corpo, muitos homens não aparentavam a idade que tinham. Mesmo assim, ele era muito mais atraente e bem conservado que a maioria, a não ser pelas linhas junto da boca. E na testa.
   Ah, a boca de Alexander!
   — Por Deus — resmungou ela, cruzando os braços com força. — Ele está ainda mais sedutor, atraente, bonito e intimidante do que há quatorze anos!
   Passara-se tanto tempo e parecia que fora no dia anterior,..
   Imóvel no meio do vestíbulo, Carolyn sentiu-se envolvida pelas imagens do passado e pela mesma excitação incontrolável que a possuíra quando vira Alexander Forrester pela primeira vez.
   Ele simplesmente a deixara sem fôlego!
   Carolyn tinha acabado de se acomodar na cadeira de vime do terraço quando viu o recém-chegado cruzar o jardim com passos confiantes.
   É claro que sabia quem ele era. Cansara-se de ouvir elogios sobre sua boa aparência, sua inteligência brilhante e mil outros detalhes, repetidos por toda a família Peterson.
   Alexander Forrester era ainda mais fascinante do que todas as descrições e elogios!
   A voz grave e aveludada lhe provocara estranhos arrepios, e ela estremecera quando notara o olhar intenso percorrer seu corpo. Subitamente, sentira-se mulher e o vira como o homem capaz de seduzi-la e despertar emoções jamais imaginadas antes.
   No primeiro instante, ficara em dúvida se os olhos eram azuis ou cinzentos ou uma combinação única das duas cores. Ao mesmo tempo, admitira a si mesma que não fazia a menor diferença.
   O que importava eram as sensações que aqueles olhos despertavam em seu íntimo, tornando-a consciente de sua própria feminilidade.
   Naquele exato momento, Carolyn perguntou a si mesma se essa total perda de controle sobre si mesma poderia ser o que os livros chamavam de amor à primeira vista.
   Então, seria mesmo verdade e podia acontecer com essa rapidez fulminante, definitiva e arrebatadora?
   Ou ela seria imatura demais para dezoito anos e incapaz de discernir a sutil diferença entre o amor e a ilusão romântica de sentir-se apaixonada?
   Alexander falava, e ela mal tinha consciência das palavras que ouvia. Só se dera conta de que confessara quanto ficara fascinada.
   Ele riu, e o som daquela risada, ligeiramente irônica, pareceu-lhe ser a concretização de seus sonhos românticos mais secretos e ousados, a promessa de prazeres proibidos e jamais admitidos.
   O som daquele riso jamais esquecido ainda ecoava nos ouvidos de Carolyn, e ela se forçou a voltar à realidade incerta do presente.
   Jess! Ela precisava defender Jess!
   O seu bem mais precioso manifestou-se, gritando da sala de jantar que acabara de pôr tudo em ordem.
   — Guardei todas as conchas, mamãe. Agora posso ir até a praia procurar mais algumas?
   — Já arrumou seu quarto?
   —  Onde está com a cabeça, mamãe? Eu já lhe disse que arrumei.
   — Sim, é claro. Eu esqueci.
   — Então... posso ir?
   —  Só se você prometer não entrar na água. Jess a encarou com uma expressão sarcástica.
   — Pensa que sou boba? A água está gelada demais.
   — E seu almoço? — insistiu Carolyn, relutante em dar sua permissão.
   —  Como quando voltar.
   Carolyn olhou para o velho relógio em seu pulso e suspirou.
   — Já passou do horário do almoço. É quase uma hora da tarde!
   — Devorei quatro panquecas no café da manhã e não estou com nem um pouco de fome. Volto a uma e meia, está bem?
   — Está bem — concordou Carolyn. — Acho que sobreviverei até uma e meia.
   Jess saiu de casa como um pé-de-vento, e Carolyn ficou imóvel, com o olhar fixo na porta fechada por muito tempo, depois da saída da filha.
  
   III
  
   Quando Carolyn voltara a se casar? Parado junto da janela de seu amplo quarto de hotel, Alex observava as ondas bravias do Atlântico.
   Aquela pergunta insistente o atormentava desde que ouvira a menina chamar Carolyn de mãe. Deixara de pensar no assunto apenas enquanto se registrava no hotel, retornando a ele imediatamente após sua entrada no quarto.
   Carol tinha uma filha, uma garota encantadora, com um sorriso cativante e os olhos do mesmo tom único de verde da mãe.
   Alex sentiu uma angústia profunda e, fechando os olhos, tentou lutar contra uma inexplicável náusea.
   Uma linda criança gerada por Carolyn... e por um outro homem!
   Mas por que sentir tanta agonia? O que havia de errado com ele? Seu relacionamento com Carolyn terminara treze anos atrás, depois de menos de doze meses de casamento. Naquela época, não tinha a menor intenção de se tornar pai. Estava ocupado demais em galgar os degraus do sucesso e não podia desperdiçar o tempo necessário para se preocupar com um filho.
   Carol ansiava por ser mãe. Chegara a chorar, pedindo-lhe que tivessem um bêbe a quem poderia se dedicar com todo o amor.
   Subitamente, essa recordação o deixou chocado.
   Ela chorara.
   Como sempre, sentira uma intensa impaciência diante daquelas lágrimas imaturas.
   Um sorriso irônico formou-se nos lábios de Alex. Mesmo com muita relutância, era obrigado a admitir que só não perdia a paciência com Carol quando estavam fazendo amor.
   Nos momentos em que ambos se perdiam na paixão física, Alex se entregava ao fascínio de Carol.
   Mais uma vez, as lembranças derrubaram as barreiras que ele erguera para se defender do passado. Já enfraquecidas, permitiram a volta de uma onda de recordações muito vívidas.
   Carol era fascinante, e Alex sentiu-se cativado segundos depois de vê-la pela primeira vez, ainda no terraço.
   Para sua surpresa, afastara todos os pensamentos relacionados ao trabalho, tal o encanto do riso meigo e do brilho vivaz dos olhos muito verdes. Também não levou mais do que alguns segundos para admirar as pernas longas e esguias, reveladas pela saia muito curta. Nunca vira uma pele tão acetinada, nem sentira tanta vontade de tocar uma mulher para ver se era mesmo real.
   Era difícil admitir que se tratava de um caso de paixão imediata!
   Alex queria proteger aquela garota frágil, saborear a doçura de sua inocência e, ao mesmo tempo, possuir e ser o único dono do corpo que refletia ingenuidade, mas era de uma sensualidade irresistível. Naquele instante, decidiu fazer tudo para satisfazer esse desejo intenso, uma ânsia jamais despertada antes por mulher nenhuma.
   Durante a semana que antecedeu ao casamento, Alex se entregou aos artifícios da conquista, sem pensar em mais nada. Não se afastava de Carol nem por um minuto, conversando, rindo, provocando-a com insinuações maliciosas e tocando-a sempre com maior intimidade.
   Ingênua e inexperiente nesse jogo de sedução, Carol estava pronta para se entregar a ele antes do final da semana.
   Finalmente, chegou o dia do casamento, quente e abafado. A cerimônia foi comovente, e todos choraram... inclusive Carol, que não resistia as lágrimas nos momentos românticos.
   Com muito esforço, Alex controlou-se para não beijá-la ali mesmo, na igreja, secando-lhe as lágrimas com seus lábios.
   Enquanto saboreava o champanhe gelado, durante a recepção, Alex não tirava os olhos da jovem vibrante e inconsciente da própria sedução a quem ele decidira possuir o mais rapidamente possível.
   Carol estava ainda mais atraente com o vestido de dama de honra. A gaze verde realçava a luminosidade da pele bronzeada e intensificava a cor dos olhos brilhantes como esmeraldas. Acima de tudo, o tecido fino e quase transparente moldava os seios firmes e acentuava a cintura fina e as pernas esguias.
   Alex quase sorriu ao se dar conta de que a achava ainda mais excitante com um vestido do que com um minúsculo biquini. Numa tentativa vã de sufocar a onda de desejo que o envolveu, esvaziou a taça de champanhe.
   Naquele instante, seus olhos encontraram os de Carol, e pôde perceber que ela compreendia a mensagem de extremo desejo expressa por seu olhar.
   Ele sentiu o desejo crescer e a viu mover os lábios num convite silencioso.
   - Venha dançar comigo.
   Livrando-se da taça vazia, Alex cruzou o salão. Carol aninhou-se em seus braços, com um sorriso nos lábios... e uma promessa nos olhos que brilhavam de emoção.
   Entretanto, dançar com Carol era uma tortura que ele não calculara.
   — Quando acha que podemos fugir dessa multidão? — murmurou Alex, com a voz rouca de desejo.
   — Não podemos sair antes dos noivos...
   O tremor do corpo dela em seus braços revelava que Carol estava pronta para ser amada com paixão.
   — Por que quer saber? — perguntou ela, encostando-se mais no corpo rijo de Alex.
   Chegara a hora de deixar de lado o jogo da sedução e se dedicar à inebriante tarefa de levá-la para a cama.
   —  Quero beijar você... em algum lugar em que estejamos só nós dois.
   — Eu também... quero beijá-lo.
   A voz trêmula de Carol foi a gota d'água. Alex já não continha a impaciência e muito menos o desejo.
   — Realmente acha que alguém sentirá falta de nós, Carol? O salão está tão cheio...
   — Você teria coragem?
   — De ficar sozinho com você? Eu seria capaz de desafiar o mundo todo para isso.
   Momentos depois, Alex e Carol riam, correndo de mãos dadas em direção ao carro dele. Estavam livres!
   Só então, Alex deu-se conta da dificuldade de encontrar um local onde pudesse ficar a sós com ela.
   A festa demoraria muito a findar, e a mansão dos Peterson estaria deserta, mas sentiria vergonha de usar a casa dos pais de seu amigo para seduzir Carol. Só havia duas opções: o carro ou um quarto de motel.
   A primeira possibilidade lhe parecia uma atitude de adolescente obcecado por sexo e a segunda desmereceria Carol.
   — Alexander?
   A voz sussurrante dela e seu olhar de total inocência perturbaram-no ainda mais.
   —  Eu desafiaria o mundo para ficar a sós com você, mas não me conformaria se lhe oferecesse menos do que merece.
   — Eu... não entendo.
   O ruído estridente de uma buzina trouxe Alex de volta ao presente. Desorientado, olhou a sua volta, sem saber onde se encontrava. As recordações tinham sido tão reais que lhe parecia impossível estar num quarto de hotel, e não no pátio do estacionamento de um outro, a poucas quadras dali.
   Essa fraqueza de voltar ao passado estava se tornando estranha demais! Tivera a exata impressão de ouvir a voz de Carol murmurando a seu lado.
   — Eu... não entendo.
   Sem sombra de dúvida, essa fora a causa de todos os desentendimentos entre os dois. A imatura Carolyn jamais entendia as obrigações de ser adulta!
   Ela teria mudado, enfim crescido?
   Novamente o som de uma buzina cortou o fio de seus pensamentos. Franzindo a testa, começou a achar que seu pedido de um quarto com vista para o oceano fora um erro. A avenida à beira-mar estava sempre movimentada, e o barulho afetaria seu descanso.
   Mas a beleza do oceano talvez compensasse as desvantagens. Admirando a longa praia de areias brancas, seus olhos se detiveram em uma pequena figura.
   Jess? A menina que caminhava lentamente, com um balde na mão, parecia-se muito com ela. Estaria procurando conchas na praia? Alex sorriu, lembrando-se de sua infância, quando passava horas a fio remexendo a areia, em busca de algum caramujo interessante.
   Contrariando sua natureza, Alex cedeu a um impulso e, antes de ter tempo de se arrepender, saiu do quarto. Minutos depois, chegou à praia e aproximou-se da menina que se ajoelhara na areia, cavando-a com sua pazinha de plástico.
   — Olá! Está procurando algum tesouro perdido? — perguntou Alex, agachando-se ao lado dela.
   A primeira reação de Jess foi de desconfiança, mas logo ela o reconheceu.
   — Oh, como vai, senhor...
   — Meu nome é Alex.
   — Olá, Alex. — Ela sorriu, irradiando alegria de viver. — Não estou procurando nenhum tesouro, só conchas. Mas dizem que existe uma arca com moedas de ouro escondida em algum lugar desta praia.
   —  É, também ouvi essa história. Quando eu era criança, sonhava em encontrar o tesouro... enquanto cavava a areia à procura de conchas.
   — Oh! Você catava conchas... aqui?
   Jess perdera todo o interesse em sua atividade anterior e o fitava, fascinada.
   — Era um de meus passatempos favoritos.
   — Então, vinha muito a Cape May?
   — Passava todos os verões aqui. Na verdade, eu ficava na casa onde você mora.
   — Conhece os Peterson? — O rosto de Jess se iluminou.
   — Sim. Mike e eu crescemos juntos.
   — O tio Mike?
   — Ele é mesmo seu tio?
   Perplexo, Alex tentava encontrar a conexão familiar.
   — Claro que não. Mas eu o chamo de tio.
   Só então Alex lembrou-se de que a esposa de Mike fora, e talvez ainda fosse, a melhor amiga de Carolyn.
   A conversa entre os dois fluiu com uma facilidade que surpreendeu Alex. Ele raramente se entendia bem com crianças!
   — Você gosta de pescar? — perguntou ele, espantado com o número de gostos que tinham em comum.
   — Adoro! Só que minha mãe detesta...
   — E seu pai?
   Jess encolheu os ombros num gesto que deveria revelar indiferença, mas demonstrava uma profunda tensão.
   — Eu não tenho pai.
   —  Oh, eu... sinto muito.
   Na verdade, ele se culpava por ter se intrometido em um assunto que não era de sua conta.
   —  Meu pai morreu. — Jess suspirou. — Quando eu era bêbe. Não me lembro dele, mas sei como era porque tenho um retrato dele em minha escrivaninha.
   — Então, você e sua mãe são sozinhas?
   Apesar de sua vergonha em intrometer-se na vida alheia, Alex continuava a inquirir a menina disfarçadamente. Precisava saber, tinha de descobrir se existia um homem na vida de Carolyn. Enquanto afirmava a si mesmo que pouco se importava com o fato, ele admitia que era um mentiroso.
   —  Somos sozinhas, mas não faz mal nenhum. Mamãe é ótima, e nos divertimos muito juntas.
   Alex surpreendeu-se com a intensidade do alívio que sentiu ao ouvir as palavras de Jess. Entretanto, percebeu que a garota ficara ainda mais tensa, mordendo os lábios e com um olhar ansioso.
   — Está com algum problema, Jess? — perguntou ele, sem fazer rodeios.
   —  Bem...
   —  Pode falar, garota. Coragem!
   — Eu estava... bem, só queria saber por quanto tempo pretende ficar em Cape May — murmurou ela, desviando o olhar.
   —  Talvez uma semana — respondeu Alex, sem imaginar aonde a menina pretendia chegar. — Por quê?
   —  Acho que... — Jess corou, embaraçada — não gostaria de... ir pescar comigo, não é?
   Lembrando-se de que a menina não tinha pai, nem mesmo uma figura paterna substituta, Alex segurou a mãozinha delicada entre as suas.
   — Pois achou errado. Eu gostaria muito de ir pescar com você.
   —  É verdade? — Ela quase gritava de tanta alegria. —
   Fantástico! Também gostaria de procurar conchas comigo? Não agora, é claro! Quando estiver com outra roupa, certo?
   Ela o encarou, admirando a calça branca bem passada e o blazer impecável.
   Alex deu uma gargalhada, imaginando como estaria ridículo aos olhos da menina.
   — Que tal amanhã?
   — Está falando sério, Alex?
   — Sem dúvida. A não ser que esteja chovendo, é claro.
   — É claro! Mas ouvi o rádio, e os meteorologistas disseram que amanhã será um dia quente e sem nuvens.
   — Então, você tem um compromisso comigo. — Ele hesitou, imaginando qual seria a reação de Carolyn frente a esse convite. — Sua mãe não fará nenhuma objeção?
   Dessa vez, o gesto de ombros de Jess realmente revelava descontração.
   — Ora! Por que ela não me deixaria ir? Afinal, não é como se você era um desconhecido!
   — Se você fosse — corrigiu-a Alex instintivamente, enquanto admitia que as objeções de Carolyn seriam justamente por conhecê-lo.
   — Você parece minha mãe! Ela está sempre me corrigindo... Céus! Esqueci-me dela! Que horas são?
   — Duas e dez. Por quê?
   — Eu devia estar de volta a uma e meia! — Jess fez uma careta de horror. — Preciso voar para casa.
   Ela já se afastara alguns passos, quando se deteve, viran-do-se para trás.
   — A que horas nos encontramos amanhã?
   — A que horas você toma café?
   — Perto das oito.
   —  Que tal oito e meia?
   — Seria melhor às nove. — Jess deu um sorriso malicioso que encantou Alex. — Vou me oferecer para lavar a louça do café... para me penitenciar por ter chegado atrasada hoje.
   — Ótima ideia. Vejo você amanhã, Jess.
   Mais uma vez, a menina começou a se afastar, correndo, e parou novamente.
   — Gostaria de ir jantar em minha casa, hoje à noite?
   Todos seus instintos o aconselhavam a recusar o convite, mas a expressão de expectativa da menina enfraqueceu suas defesas. Além do mais, algo relativo a ela o intrigava. Não se tratava da personalidade de Jess, e sim o fato de sua existência! Havia algo muito errado...
   — Alex?
   Seria impossível recusar. Aliás, ele não conseguiria, nem se quisesse, resistir ao apelo do rosto esperançoso à espera de sua resposta. Alex cedeu, sorrindo com uma ternura da qual nunca se julgara capaz.
   — Ficarei muito honrado em jantar com você.
   — Oba! — Jess dava pulos de alegria. — Mas agora preciso voar para casa!
   — Espere! Não me disse a que horas devo chegar.
   — Céus! Como sou idiota! Bem, nós jantamos pouco depois das seis horas. É muito cedo para você?
   — Não, está ótimo. Agora, trate de correr, ou vai ficar em má situação com sua mãe.
   — Tem razão. Até mais tarde...
   A menina, de pernas longas e ainda finas, correu pela praia, com uma velocidade incrível. Alex permaneceu imóvel, vendo-a diminuir até se transformar em um ponto em movimento a distância.
   Enquanto caminhava de volta para o hotel, ele tentava entender, intrigado, a estranha simpatia que sentia por aquela menina. Estaria ficando com o coração ou com o miolo mole?
  
   IV
  
   Carolyn perdeu a noção de tempo, pouco depois que Jess saiu de casa, batendo a porta com seu excesso de energia.
   Havia muito trabalho a ser feito se ela quisesse estar com a casa pronta para receber hóspedes no início do verão. Examinando as tarefas a sua espera, ela tentou controlar a tendência de proteger demais a filha. Convenceu-se de que Jess não corria nenhum perigo na praia e rezou para que nada ameaçasse a paz tão arduamente alcançada.
   Mais calma, Carolyn começou a trabalhar. Infelizmente, eram tarefas rotineiras, e sua mente pôde divagar, voltando ao passado. Em especial, àquela noite inesquecível, há quatorze longos anos...
   Depois de uma semana na companhia de Alexander Forrester, Carolyn estava completa e perdidamente apaixonada.
   Ele era a personificação de todas as suas fantasias românticas do homem ideal: atraente, confiante em si mesmo, de personalidade marcante, além de inteligente e com um irresistível senso de humor.
   Não apenas ela havia notado que Alex se destacava entre todos os homens presentes — mais novos ou mais velhos —, e sua segurança ajudara a aumentar o brilho da cerimônia do casamento. Ele era um líder natural, capaz de organizar tudo e manter uma aparência de calma absoluta.
   Então, durante a recepção, ela tivera de passar pelo teste de enfrentá-lo com a mesma segurança. Desafiara Alex, convidando-o para dançar e lhe concedera a vitória tão logo se aninhara em seus braços fortes.
   Para Carolyn, dançar com Alexander, ser mantida de encontro ao corpo cálido e musculoso, ouvir a voz murmurante em seus ouvidos, sentir a respiração dele tocar seu rosto era, ao mesmo tempo, a essência do prazer e uma tortura insuportável. Queria mais, queria tudo...
   E ele murmurara ao seu ouvido, sugerindo que poderia lhe oferecer tudo. Dissera que desafiaria o mundo todo para ficarem a sós.
   Eram palavras que excitariam uma mulher madura e experiente, próprias para enlouquecer uma garota romântica de apenas dezoito anos.
   Na verdade, ela nem sonharia em recusar o convite de abandonar a recepção, quebrando todas as regras de boa educação que recebera. Cedendo à personalidade mais forte de Alex, deixou-se levar. Enquanto corriam, de mãos dadas, pelo pátio do estacionamento, Carolyn tinha a impressão de que ia desmaiar de expectativa.
   Quando Alexander lhe confessara que não se conformaria em lhe oferecer menos do que ela merecia, Carolyn não compreendeu o sentido daquelas palavras.
   — Eu não entendo — murmurou ela, certa de que Alexander tinha mudado de ideia e já não a desejava mais.
   — Não sei onde poderemos ficar a sós — explicou ele, com uma expressão de impaciência. — Não a insultarei sugerindo um quarto de motel e não admito fazer amor com você no banco traseiro de um carro... como um adolescente incapaz de controlar seus desejos sexuais.
   A preocupação de Alexander a deixava lisonjeada, mas a excitação de saber que iria ser amada por aquele homem a impeliu a colocar sua juventude, sua virgindade e sua reputação nas mãos dele.
   — Não importa o lugar... se eu for amada por você.
   — Ah, Carol! Você me faz sentir o homem mais importante do mundo. — Ele acariciou o rosto que se oferecia sem medo. — No entanto, se aceitasse sua oferta, acabaria sentindo vergonha por ter me aproveitado de sua inocência.
   — Mas...
   Em pânico, Carolyn achou que Alex iria desistir de tudo e voltar com ela para a festa.
   — Não há outra solução — disse ele, sem hesitar. — Temos de nos casar.
   — C-Casar? — A voz de Carolyn era muito baixa, mas ela não conseguia esconder a exaltação.
   — Exatamente. Ou será que você não quer se casar comigo?
   — Sim! É claro que quero! — Na euforia do momento, Carolyn nem sequer se lembrou de que os dois se conheciam havia apenas uma semana. — Quando?
   —  O mais depressa possível. — Alex quase a empurrou para dentro do carro. — Vamos embora, querida!
   — Para onde? — perguntou Carolyn, completamente atordoada.
   — Vamos para a casa dos Peterson. Precisamos fazer as malas.
   — Então... estamos fugindo para nos casar?
   — Você tem coragem? — Ele lançou um olhar de desafio a Carolyn. — Eu tenho.
   Subitamente, ela sentiu um medo intenso.
   — E claro que eu tenho coragem, mas... você está certo do que realmente quer? Acha necessário casar-se comigo?
   Alexander parou o carro diante da casa dos Peterson e desligou o motor. Então, encarou-a com uma expressão de profunda seriedade.
   — Minha querida Carol... sei perfeitamente bem o que quero. Desejo você só para mim... e para sempre.
   Para sempre.
   Carolyn voltou ao presente, lutando contra as lágrimas e surpresa por se encontrar sentada em uma cama, num dos quartos. Lembrava-se apenas de ter entrado ali a fim de terminar a arrumação ao cômodo para a chegada de algum hóspede inesperado.
   Para sempre.
   Seu suspiro ecoou no silêncio do quarto. Infelizmente, o sempre de Alex durou pouco tempo. A eternidade do amor não chegara nem a um ano.
   Na verdade, o casamento fracassara pouco depois de terem se unido legalmente. Alexander destruíra o relacionamento com sua arma mais eficaz, a negligência. Como qualquer ser vivo, o amor morrera por falta de cuidado e atenção.
   Uma onda de ressentimento e raiva despertou o espírito combativo de Carolyn. Sentiu ódio de Alexander por ter reaparecido subitamente em sua vida, causando o despertar de memórias tão penosas, lembranças de dor que lutara tanto para abafar, e provocando o medo de que ele descobrisse segredos nunca revelados.
   Recuperando a energia, ela voltou a trabalhar a fim de não pensar em mais nada. Então, olhou para o relógio, que acabara de espanar. Eram duas e quinze! Estaria certo ou...
   Onde estava Jess? Ela prometera voltar a uma e meia. Carolyn quase perdeu o controle da ansiedade que crescia assustadoramente.
   —  Mamãe? Desculpe, eu me atrasei um pouco... perdi a noção do tempo.
   Como a maioria das mães, Carolyn sentiu que o medo se transformava em raiva. Com o pano de pó nas mãos, chegou até a escada e procurou a filha no andar de baixo.
   — Jess? Onde você se meteu agora?
   — Estou na cozinha, mamãe.
   A menina apareceu à porta e viu a mãe descer a escada rapidamente e com uma expressão de raiva no rosto quase sempre calmo.
   — Está tudo bem...
   — Tudo bem? Pois eu estou profundamente aborrecida. Sabe como me sinto quando se atrasa, não? Você é uma menina bonita, e acontecem coisas horríveis todos os dias com garotas de sua idade. Basta ler os jornais!
   — Eu sei, mamãe. Sinto muito. Esqueci o relógio em casa e...
   —  E perdeu a noção das horas enquanto catava conchas, certo? — interrompeu-a Carolyn, furiosa.
   — Não foi bem assim. Perdi a hora porque fiquei conversando.
   —  Conversando? — Carolyn franziu a testa, intrigada. — Então encontrou uma de suas amigas? Elas não costumam ir à praia...
   — Não era uma amiga. Fiquei conversando com Alex!
   Ao ver o sorriso radiante da filha, Carolyn quase perdeu o fôlego de pavor.
   — Alex? — repetiu ela, procurando recuperar o controle.
   — Claro! Sabe quem é... aquele homem que esteve aqui em casa antes. Você o chamou de Alexander.
   Jess não ignorava a regra materna de que pessoas adultas nunca deviam ser chamadas pelo primeiro nome e tratou de se explicar melhor.
   — Ele me pediu que eu o chamasse de Alex, Aliás, nem sei seu sobrenome.
   — Ah... é esse Alex — murmurou Carolyn, num fio de voz.
   — Espero que não se aborreça, mamãe.
   Por algum motivo inexplicável, a expressão de Jess era de culpa e ela mordia o lábio inferior, com os olhos fixos no chão.
   — Aborrecer? — Subitamente, Carolyn teve certeza absoluta de que não iria gostar nada das próximas palavras da filha. — E com o que eu me aborreceria?
   Jess hesitou por alguns segundos e depois comunicou a novidade, falando sem se deter para respirar:
   — Convidei Alex para jantar conosco hoje à noite.
   Jantar conosco?
   Chocada, Carolyn mal reconheceu a própria voz.
   —  Isso mesmojantar. — Jess encarou a mãe com uma expressão de apelo nos olhos verdes.
   — Mas você mal o conhece — argumentou Carolyn, deliberadamente usando "você", e não "nós".
   —  Ele é muito simpático, mamãe. Conversamos bastante na praia.
   — Ele estava na praia?
   Carolyn não disfarçava a incredulidade. Alexander na praia? Certamente não combinava com a imagem de suas recordações... depois de primeira semana. Nos sete dias mais felizes de sua vida, ele fizera o impossível para encantá-la, pois o objetivo era seduzi-la.
   —  Sim. Ele nem se importou com a areia que sujou seus sapatos e sua calça branca. Contou-me que também colecionava conchas quando era menino.
   — Verdade? — Carolyn se surpreendia mais a cada nova declaração da filha. Nunca soubera desse tipo de detalhe sobre a infância de Alexander.                                                     
   — Verdade. E não é só isso! Ele também gosta de pescar — acrescentou Jess, como se essa predileção de Alexander o tornasse ainda mais especial.
   —  É mesmo? — murmurou Carolyn, cerrando os dentes. Alexander nunca se dera ao trabalho de partilhar seus gostos com ela.
   — Não vai se incomodar se ele vier, não é? — perguntou Jess, extremamente ansiosa.
   Logicamente Carolyn se incomodaria e muito com a presença daquele homem em sua casa. Ela nunca contara a Jess certos fatos sobre seu parentesco e, o que era mais grave e preocupante, também os escondera de Alexander.
   Por ocupar uma posição de poder, Alexander representava um grande perigo, não apenas para a paz de espírito de Carolyn como também para os elementos mais importantes de sua vida.
   Ele podia magoá-la demais. Se tomasse conhecimento de certos fatos, Carolyn tinha certeza absoluta de que Alexander a julgaria merecedora da punição mais severa que lhe passasse pela cabeça.
   Não, não podia recebê-lo! Com muito esforço, Carolyn tentou manter uma aparência de calma exterior, enquanto imaginava sua vida, seu futuro e sua própria existência sendo ameaçadas pelo ex-marido. Se lhe abrisse a porta daquela casa, Alexander passaria mais tempo com Jess e acabaria suspeitando da verdade. Ou pelo menos, chegando perto demais!
   Além disso, não queria nenhum contato com ele por um motivo muito mais humilhante e angustiante... não podia se dar ao luxo de deixar transparecer que ainda o amava.
   — Mamãe?
   A voz de Jess parecia aumentar o pânico que envolvera Carolyn.
   — Sinto muito, querida...
   Incapaz de continuar falando, Carolyn procurava desesperadamente um pretexto, uma desculpa esfarrapada que fosse, para negar o pedido da filha. Entretanto, sua mente a traiu, pois não lhe ocorria nenhum motivo plausível para recusá-lo sem destruir a alegria de Jess. Além disso, ela já o convidara. Como poderia cancelar o convite?
   — Bem, acho que não vou me aborrecer se ele vier — disse ela finalmente, suspirando. — Mas eu não estava planejando nenhum jantar muito especial. Pretendia fazer hambúrgueres, salada e abrir uma lata de feijão branco.
   —  Tenho certeza de que Alexander vai adorar porque eu adoro esse tipo de jantar. Nós temos gostos parecidos!
   Carolyn sufocou um grito de desespero. Se não se controlasse logo, suas emoções venceriam seu bom senso habitual, e tudo estaria perdido. Precisava controlar as expressões de seu rosto, que retratavam seus sentimentos mais íntimos. Acima de tudo, tinha de ficar alguns minutos sozinha, a fim de recuperar a calma e se preparar para a noite a sua espera,
   — Vamos precisar de pão — falou ela, agarrando a primeira idéia que lhe veio à mente. — Poderia ir comprar para mim? Ah! Também não temos nada para a sobremesa.
   — É claro que eu vou! — exclamou Jess, eufórica e disposta a ajudar ao máximo. — Posso escolher a sobremesa? Que tal bolo de chocolate?
   Sem esperar pela resposta da mãe, Jess saiu correndo de casa e, como sempre, bateu a porta. Carolyn não tinha forças nem sequer para pensar em repreender a filha por esse hábito grosseiro. Como sobreviveria àquela noite? O que diria a Alexander? Sempre achara difícil manter uma conversa social com qualquer tipo de homem... em especial com esse homem!
   Seria como cruzar um campo minado, pisando nas pontas dos pés para evitar que uma bomba estourasse. Bastaria uma palavra errada ou mal pensada e toda sua vida serena e feliz iria pelos ares, irremediavelmente destroçada. Por meio da intuição e da experiência do passado, Carolyn sabia que Alexander não a perdoaria. Se descobrisse o que ela fizera e as liberdades que tomara, ficaria enfurecido.
   Desanimada e pressentindo um desastre bastante grave, Carolyn olhou a sua volta, como se procurasse uma saída para aquele problema. O único resultado de sua busca inútil foi se dar conta da desordem a seu redor. A cozinha estava um verdadeiro horror, com pratos e panelas sujas sobre a pia, vassouras, baldes e embalagens de material de limpeza espalhados por toda parte.
   Não podia permitir que Alexander jantasse num lugar tão mal cuidado! Sentindo que o trabalho a ajudaria a se acalmar, Carolyn entrou em ação, determinada a deixar a cozinha brilhando de limpeza antes da chegada do hóspede inoportuno.
   Alexander seria capaz de apostar uma soma bastante alta que Carolyn devia estar detestando a idéia de recebê-lo em casa.
   Enquanto se barbeava, ele próprio começara a se arrepender de ter aceitado o convite. Mas como recusá-lo? Jess era uma menina tão cativante que ele não teria coragem de desapontá-la!
   Carolyn o recebera com extrema frieza quando o vira naquela manhã.
   Ele entrou debaixo do chuveiro automaticamente, perdido em seus pensamentos.
   Os dois nunca haviam encontrado um assunto em comum depois de um mês de casados. Fazia treze anos que não conversavam, sobre o que falariam agora?
   Aparentemente, Carolyn estava tomando conta daquela pensão em nome da família Peterson. E, no momento, Mike era diretor executivo da firma onde trabalhava.
   Infelizmente, o problema não era apenas a falta de assuntos em comum. Eles nunca tinham encontrado um modo de se comunicar.
   Não, isso não era bem verdade. Os dois se comunicavam com perfeição... dentro dos limites da cama de casal! Naquele pequeno território, ele e Carolyn nem sequer precisavam de palavras para se entenderem como se fossem um só ser.
   Alexander estremeceu ao lembrar-se daquele período de sensualidade desenfreada e de descobertas eróticas inesquecíveis.
   Suspirando, ele saiu do banho e começou a se enxugar. Tinha de se apressar se quisesse levar um pequeno presente a sua anfitriã, conforme pedia a boa educação.
   Deveria levar-lhe flores?
   Subitamente enfurecido, Alexander jogou a toalha ao chão e entrou no quarto, para se vestir. Nunca dera flores a Carolyn, nem antes nem depois de se casarem. Se fosse sincero consigo mesmo, coraria de vergonha.
   Nunca lhe dera flores. Nunca a acompanhara para fazer compras. Nunca a levara de férias a lugar algum.
   Sempre estivera ocupado demais com o sucesso de sua carreira para dar atenção a Carolyn, depois que ela havia se tornado sua esposa.
   Parado diante do espelho, Alexander viu-se, pela primeira vez, face a face com sua monumental arrogância. E agora era capaz de admitir que fora egoísta.
   Não poderia culpar Carolyn por não querer que ele entrasse na casa dela. A pobre mulher talvez não quisesse partilhar o mesmo planeta que ele!
   Com uma expressão sombria, fixou o olhar no telefone. Deveria ligar e, pedindo desculpa, dizer que não poderia ir, pois surgira um outro compromisso?
   Talvez fosse o mais sensato, se não contasse Jess. Ele se encantara com a exuberância da menina e, a não ser na eventualidade de um terremoto ou de um furacão, sabia que tocaria a campainha da casa dos Peterson às seis horas em ponto. Não seria fácil se comportar como um convidado cativante e à altura da efervescente menina, mas não a desapontaria.
   Uma hora mais tarde, ele tocava a campainha da pensão, sentindo-se um verdadeiro idiota. Além de um buque de flores do campo na mão direita, na esquerda ele carregava um enorme balde de plástico colorido, pelo menos cinco vezes maior do que o de Jess.
  
   VI
  
   Ele chegou!
   — É óbvio que sim — resmungou Carolyn, que se sobressaltara ao ouvir a campainha.
   Ela não precisaria ter se preocupado em controlar a tensão em sua voz porque Jess não a ouvira. A garota praticamente voara para abrir a porta tão logo escutara o toque da campainha.
   —  Olá, Alex!
   Carolyn ouviu Jess cumprimentando o convidado enquanto saía da cozinha, com muita relutância, para recebê-lo. Ainda estava entrando no vestíbulo quando ecoou a exclamação de surpresa da filha.
   — É para mim?! Muito obrigada!
   Alex trouxera algo para Jess? Carolyn não conseguia acreditar. Alexander Forrester dando presentes? Mais uma vez, esse ato não combinava nem um pouco com a imagem que guardava de seu ex-marido. Tinha uma memória excelente e, infelizmente, lembrava-se de todos os minutos de vida em comum, durante os quais nunca o vira dar nada, nem a ela nem a ninguém mais.
   —  Mamãe! Olhe só o que Alex trouxe para mim! — Com um sorriso orgulhoso e feliz, Jess ergueu o enorme balde de plástico cor de laranja. — É para quando eu for catar conchas. Não acha fantástico?
   —  Sim — murmurou Carolyn, forçando-se a sorrir para a filha. — E... muito colorido.
   — Boa noite, Carolyn — disse Alex, obrigando-a a encará-lo diretamente e lhe oferecendo o buque. — E para você. Achei que não precisaria de um balde.
   Boquiaberta, Carolyn estendeu as mãos e levou algum tempo para se recuperar da surpresa. Então, lembrando-se das boas maneiras, agradeceu.
   — Entre, por favor. — Ela se voltou para a filha. — Receba o senhor... Alex, enquanto vou colocar as flores num vaso.
   — Claro. Quer ver minha coleção de conchas, Alex?
   — Sem dúvida que quero!
   Carolyn fugiu para a cozinha, apavorada com sua reação diante do sorriso irresistível de Alex. Ficara com as pernas trémulas! A situação ia ser mais difícil do que previra. Acreditara que agora, depois de tantos anos, o fascínio dele já não a afetasse tanto.
   Respirando fundo para se acalmar, ela encheu um vaso de água e aproveitou para molhar os pulsos e o rosto afogueado. Completamente distraída, quase derrubou o que tinha nas mãos ao ouvir a voz da filha bem as suas costas.
   — Mamãe, Alex quer saber se pode ajudar você a preparar o jantar. — Jess estava entrando na cozinha, acompanhada de Alexander. — Ele diz que faz um hambúrguer fantástico! Será que ela ouvira bem? Carolyn encarou Alexander com um olhar de total incredulidade. Primeiro os presentes e agora a oferta de ajuda. Era algo inédito e bom demais para ser verdade! Ao vê-la franzir a testa, Alex encolheu os ombros e sorriu, — Sabe mesmo fazer hambúrguer? Tem certeza? A necessidade de ser discreta na frente de Jess impediu-a de lembrar Alex de que ele não era capaz nem mesmo de ferver água e jamais se oferecera sequer para arrumar a mesa no breve período de seu casamento.
   — Absoluta! Quando se vive sozinho, janta-se fora todos os dias, ou se aprende a cuidar de si mesmo. — Ele deu um sorriso irónico. — Cansei-me de passar vários anos comendo em restaurantes e então aprendi a cozinhar.
   — Isso é inacreditável! — murmurou Carolyn.
   —Você mora sozinho? — perguntou Jess, com a impetuosidade de uma adolescente, — Não tem uma esposa ou... alguém?
   — Não. Nenhuma das duas opções.
   Carolyn lançou um olhar a Alex, revelando-lhe que ouvira o comentário em voz baixa.
   — Deve ser horrível! — exclamou Jess. — Estou me referindo a ficar sozinho o tempo todo.
   Carolyn sabia que a solidão não incomodava a quem só pensava no trabalho, mas, prudentemente, evitou revelar seus pensamentos.
   — É verdade, sinto-me um tanto solitário às vezes. Agora, Alex fitou Carolyn, a fim de lhe comunicar que sabia muito bem quais eram os pensamentos dela a esse respeito.
   — Não tem nenhuma namorada? Não sai com nenhuma moça?
   Com toda a inocência, Jess estava submetendo-o a um interrogatório, e Carolyn decidiu interferir. Se a deixasse continuar, Alex imaginaria que ela também se interessava por sua vida pessoal, e nada podia estar mais longe da verdade. Pelo menos, era o que repetia a si mesma.
   — Jess! Esse assunto não é de sua conta!
   —  Não faz mal. Eu não me incomodo com as perguntas dela — disse Alex, que, depois de ter respondido a Carolyn, voltou-se de novo para Jess- — É claro que saio com diversas moças. E você? Já pode sair com rapazes?
   Embora a pergunta fosse dirigida a Jess, Carolyn pressentiu que Alex a formulara para ela. Entretanto, como jamais admitiria que não saía com homem nenhum, manteve-se muda.
   — Ainda não tenho permissão para sair — respondeu Jess, que não tinha nada a esconder. — Só poderei quando completar quinze anos.
   — E quanto tempo falta para essa idade maravilhosa? Quatro, cinco anos?
   — Oh, não! Só faltam dois. — Jess suspirou dramaticamente. — Parece uma eternidade, mas não me importo muito porque mamãe também nunca sai com ninguém!
   Carolyn estava menos preocupada com a tagarelice de Jess sobre sua vida íntima do que com a possibilidade de despertar as suspeitas de Alex em relação à idade da menina.
   — Nunca? — perguntou Alex, com a voz muito suave, encarando Carolyn fixamente. — É mesmo verdade?
   Ela sentiu alívio e raiva ao mesmo tempo. Alex não prestara atenção ao detalhe referente à idade de Jess, mas ficara sabendo que sua vida era um deserto emocional. O pior era que o olhar penetrante não se desviava, e seria obrigada a responder e revelar a verdade. Seria um mau exemplo mentir na frente da filha.
   — É... eu não costumo sair com ninguém.
   — Por quê?
   Alexander era mesmo insistente! Carolyn respirou fundo para se controlar, lembrando a si mesma que já conhecia essa característica dele. Afinal, não a levara até diante do altar e depois diretamente para a cama em tempo recorde?
   A lembrança dos momentos de paixão que haviam partilhado despertou um intenso desejo em Carolyn. Ainda sentia-se atraída demais por aquele homem e, se não disfarçasse suas emoções com uma expressão de profunda indiferença, estaria perdida.
   —  Sou uma mãe dedicada — respondeu ela, com voz fria e contida. — Levo muito a sério minhas obrigações nesse sentido. Não me agrada deixar Jess com outras pessoas.
   — Entendo — disse Alex, com uma expressão de quem não acreditara em uma só palavra.
   Jess começou a rir, sendo imediatamente acompanhada por Alex, e Carolyn enrubesceu, sentindo-se uma perfeita idiota.
   — Bem... estou morrendo de fome. E vocês? — Alex desviou o assunto com maestria. — Que tal começarmos a preparar a comida?
   — Perfeito! — exclamou Carolyn, aliviada. Pegue a salada na geladeira, Jess. Enquanto isso, cuidarei da grelha.
   Ela se dirigia para a porta que dava para o pátio lateral, quando sentiu que Alex a segurou pelo braço. Subitamente, estavam muito próximos, e seria impossível ignorar quanto aquele homem a afetava.
   Bastara um mero toque para sentir o sangue correr mais rápido em suas veias e o coração disparar. Carolyn ficou chocada com sua fraqueza diante da força sensual de Alex e da facilidade com que ele a perturbava.
   — Pode deixar que eu cuido da grelha.
   Eram palavras tão simples e tão banais! Entretanto, a suavidade do tom de voz e a presença evidente de desejo nos olhos brilhantes, somadas ao toque da mão em seu braço provocavam o efeito potente de uma carícia íntima.
   — Está bem... — Carolyn sentia-se dominada por uma violenta onda de sensações físicas e precisou lutar arduamente para desviar os olhos. — Eu... eu cuidarei da carne e dos molhos.
   — Ótimo! — exclamou Alex, retirando a mão do braço dela. Com um andar indolente, ele saiu da cozinha.
   — Não acha Alex fantástico, mamãe? Acho que estou apaixonada por ele!
   Carolyn ainda não se sentia com forças para responder à filha. Descobrira, naquele instante, que continuava apaixonada por Alexander Forrester!
   Com muito esforço, afastou esse pensamento preocupante de sua mente e obrigou-se a sorrir para Jess.
   —  Não acha que a diferença de idade é grande demais, filha?
   — Francamente, mamãe! Eu não estava me referindo a essa coisa melada!
   — Eu sei disso, querida. Só estava provocando você.
   Ela estava abrindo o pacote de carne moída, que retirara da geladeira, quando Alex entrou de novo na cozinha.
   —  Que coisa melada? Há algo de errado com a carne dos hambúrgueres?
   Jess caiu na gargalhada, e Carolyn, pega de surpresa, deu a primeira explicação que lhe veio à mente.
   — Não, claro que não! Era apenas uma conversa de mulher para mulher.
   — Entendo. — Alex olhou maliciosamente para as duas. — E os homens são excluídos dessa conversa melada, certo?
   — É evidente que são — respondeu Jess, bancando a adulta. — Se não fossem, deixaria de ser uma conversa de mulheres, concorda?
   — Desisto! Sei quando estou em desvantagem numérica — brincou Alex, pegando a vasilha de carne. — Voltemos aò que interessa... quem quer cebola no hambúrguer?
   Para surpresa de Carolyn, a noite acabara sendo bastante agradável, levando-se em conta os perigos daquele encontro indesejado. Já era bem tarde, e ela não conseguira ainda dormir, revendo cada detalhe daquela noite.
   Alex se mostrara um convidado descontraído e pouco exigente, que, além de bem-humorado, se dispusera a ajudar de todas as formas possíveis. Tinha preparado os hambúrgueres, que eram excepcionalmente bons. Após o jantar, distraíra Jess enquanto os três arrumavam e limpavam tudo.
   Esse homem prestativo poderia mesmo ser o mesmo Alexander Forrester que jamais movera um dedo para ajudá-la durante os poucos meses de seu casamento? Que nunca notara a ordem impecável da casa... a casa comprada alguns meses após se casarem e que passara a pertencer a Carolyn após o divórcio — por insistência dele — e a qual lhe permitira criar esse novo lar para Jess?
   Carolyn deu um sorriso amargo ao recordar quão pouco Alex notara seus esforços. Ele chegara a comparar as tarefas de uma dona de casa com a técnica das faxineiras que limpavam o escritório onde trabalhava e passava a maior parte de seu tempo. Seria impossível esquecer quanto haviam discutido e brigado por causa da atenção obsessiva que ele dedicava ao trabalho. Embora não o quisesse, Carolyn reviveu a dor das repetidas rejeições que sofrera durante a breve união com Alex.
   Quando a dor se tornara insuportável, ela terminara tudo, mas não conseguira agir de maneira calma e inteligente. Fora irracional, descontrolada e fizera acusações chorosas.
   Acusara Alexander de ter uma amante, não uma bela e ardente mulher, mas uma rival muito mais ameaçadora: a ambição de alcançar o sucesso a qualquer custo.
   Com o passar dos anos, Carolyn admitira a verdade amarga. Reagira de modo imaturo simplesmente porque era jovem demais e romântica em excesso, agarrando-se à ilusão de Alexander como um herói, o homem perfeito de seus sonhos.
   Ela riu baixinho, e o som ecoou no quarto às escuras. Amadurecera a duras penas e agora questionava muitos pontos de seu passado. Por que esse herói escolhera uma jovem de apenas dezoito anos para partilhar sua vida?
   Carolyn já não era mais uma adolescente que vivia de ilusão. Tornara-se uma mulher adulta e realista. Mudara demais nos treze anos em que passara sozinha. Alexander também teria mudado?
   O homem que ela conhecera e com quem vivera jamais se preocupara em ajudar ninguém e nunca lhe trouxera flores. O Alexander que viera a sua casa essa noite não hesitara em trabalhar lado a lado com uma mulher e lhe dera um buquê. Inquieta, ela continuou a analisar os acontecimentos daquela noite.
   Depois de terem arrumado tudo, Alex convidou Jess e Carolyn para jogarem Monopólio, levando as duas à falência.
   Ah! Sem dúvida, ele se comportara como o convidado perfeito e conquistara Jess por completo. Na verdade, a menina estava tão fascinada que nem sequer protestara quando ele revelara os planos para o domingo.
   Sem perceber que estava dando um passo em falso, Alex mencionara a programação de ambos para a manhã do dia seguinte. A noite chegava ao fim, para alívio de Carolyn, e Jess estava guardando o jogo quando ele tocou no assunto inocentemente.
   —  Então vamos começar bem cedo amanhã, Jess?
   —  Claro!
   Carolyn ergueu a cabeça, curiosa.
   — Amanhã? — Ela olhou para a filha e depois para Alex. — Do que estão falando?
   — Alex e eu vamos catar conchas.
   — Em hipótese alguma! — esbravejou Carolyn, — Não vai a lugar nenhum amanhã cedo, mocinha. E domingo, e você tem de ir à escola dominical e depois à igreja.
   — Tenha dó, mamãe! Não sei por quanto tempo Alex ficará aqui e precisarei ir ao colégio na segunda-feira. Não posso faltar só um domingo?
   Já sacudindo a cabeça num gesto de negação, Carolyn abriu a boca para recusar o pedido de Jess, quando Alex manifestou-se antes dela:
   —  Espere um pouco, Jess! Você não me disse nada sobre escola dominical.
   — Sinto muito. — Jess curvou a cabeça, com intenção de demonstrar arrependimento. — Fiquei tão entusiasmada de ir catar conchas com você que me esqueci de que amanhã era domingo...
   — Pois amanhã e domingo e...
   Mais uma vez Alex a interrompeu e, na opinião de Carolyn, tentou usurpar sua autoridade.
   — E você irá à escola dominical e à igreja — ordenou ele, com suavidade. — Depois que voltar para casa, iremos catar conchas;
   —  Só após o almoço — disse Carolyn, tentando recuperar o controle de sua autoridade sobre as atividades da filha.
   — Está bem — concordou Alex, com um sorriso zombeteiro.
   Carolyn sentiu vontade de agredi-lo por estar rindo de sua atitude possessiva em relação a Jess.
   — Então Alex pode vir para o almoço?
   O pedido de Jess colocava Carolyn em uma situação bastante difícil. Seu único desejo era negar, a fim de manter sua paz de espírito. Entretanto, como recusar a presença de Alex em sua casa, se ele combinara de passar o resto do dia com sua filha?
   A expressão de Jess revelava intensa expectativa e a de Alex era indecifrável. Sem outra opção, Carolyn cedeu, mas com esperanças de que ele recusasse.
   — Pode, é claro. A não ser que já tenha feito outros planos...
   — Não fiz plano algum — respondeu Alex, com um sorriso triunfal. — Não tenho o prazer de saborear comida caseira há muito tempo e será um prazer almoçar com vocês. Obrigado.
   Quando Alex finalmente se despediu, era clara a fascinação de Jess por ele. Aliás, uma reação bastante fácil de compreender.
   Tarde da noite, em seu quarto, Carolyn suspirou. Ela também não se deixara seduzir pelo encanto de Alexander no primeiro instante em que o vira, quatorze anos atrás?
   Fora há tanto tempo assim? E por que ainda sentia a mesma atração do passado?
   Ela tentou convencer-se de que tudo não passava de um efeito compreensível, provocado pela proximidade. Tentando não admitir a verdade, Carolyn procurou acreditar que era a reação normal entre duas pessoas de sexos diferentes, uma mera atração física.
   Infelizmente, a voz de sua consciência não a deixava se iludir. Se era tudo tão normal, por que ela sentia essa sensação de vazio que só Alexander fora capaz de afastar, transformando-a em uma mulher?
   A pergunta que ela não queria responder provocou uma onda de recordações inebriantes. Todos os seus sentidos se manifestaram com uma intensidade assustadora ao recordar os momentos de paixão e sensualidade que partilhara com aquele homem.
   Carolyn estremeceu ao relembrar o prazer da boca de Alexander apossando-se da sua, das mãos fortes percorrendo seu corpo e levando-a ao delírio.
   Por um momento de profundo deleite, teve a impressão de sentir o corpo rijo colado ao seu, exigindo e se apoderando de tudo que ela podia dar de si. Voltou a experimentar a sensação de gloriosa liberdade de todas as inibições, quando ousava tocar a pele ardente, saborear a força da boca máscula e se entregar ao mais íntimo dos contatos entre dois amantes.
   Um gemido escapou de seus lábios, exprimindo quanto ainda amava e precisava dele.
   A voz de sua consciência parecia rir-se dela, e Carolyn procurou calá-la para poder dormir.
   Entretanto, sabia que aquela voz não dizia nada além da verdade. Ela ainda o amava muito...
  
   VII
  
   Alex simplesmente perdera o sono. Resmungando, ele jogou longe as cobertas, levantou-se da cama e foi até a ampla janela do quarto. Perturbado, ficou com o olhar perdido no mar banhado pelo luar.
   Não imaginara que Carolyn continuasse tão linda e excitante quanto fora quatorze anos atrás.
   Não, não era verdade! Ela se tornara ainda mais bela e sensual.
   Será que ainda o considerava um escravo da ambição? Provavelmente sim e teria toda a razão, pois era a pura verdade.
   Embora relutasse em admitir, Alex nunca se arrependera de dedicar todas suas forças para atingir o sucesso em sua carreira... até deparar-se com aquela garota encantadora e inteligente.
   A filha de Carolyn...
   Sentiu o estômago se contrair diante da lembrança ainda nítida demais de Carolyn lhe pedindo para terem um filho. Ela adorava crianças e afirmara que queria pelo menos três. Naquela época, recusara-se a atender o pedido, acreditando que precisavam conviver mais tempo apenas os dois, quando, na verdade, julgava-a jovem demais para assumir as responsabilidades de ser mãe.
   Agora, via-se obrigado a encarar uma realidade mais brutal: não quisera filhos porque desejava liberdade absoluta para alimentar sua ambição desmedida.
   Ao se conscientizar de seu egoísmo, Alex não tinha outra opção a não ser admitir que cometera muitos erros. Em especial, enganara-se ao julgar Carolyn jovem demais para se tornar uma boa mãe.
   A maternidade provocara várias mudanças em Carolyn. Ainda lembrava-se de sua silhueta esguia e das curvas suaves. Agora ela se transformara em uma mulher e tinha um corpo maduro e sensual.
   Ele sentiu uma onda de desejo ao lembrar-se das noites de paixão que haviam partilhado.
   Não podia mais se enganar: desejava-a com muito mais ardor do que há quatorze anos!
   Na solidão do quarto, era forçado a se render à verdade. Não desejava apenas o corpo de Carolyn, que o enlouquecia, mas também queria conviver com ela, partilhar cada momento e para sempre.
   Sempre frio e racional, Alex reconhecia que estava com problemas emocionais bastante graves.
   Quando a conhecera e fizera tudo para seduzi-la, Carol não passava de uma adolescente imatura, vivendo uma fantasia. Ela o cansara com sua necessidade de atenção e carinho, mas esse tempo estava muito distante.
   Entre aqueles dias do passado e os atuais, Carolyn permitira que um outro homem se apossasse de sua vida e de seu corpo.
   Controlando-se com muito esforço, Alex sabia que estava sendo irracional. Sentia-se magoado pela traição de Carolyn e furioso ao pensar nela na cama com um outro homem.
   Embora lutasse contra esse tipo de recordação, revivia os momentos de intensa paixão e tinha a impressão de sentir a maciez da pele sedosa de Carolyn, que vibrava em seus braços, gemendo de prazer. Cada noite que haviam partilhado fora uma celebração de volúpia e a expressão de um amor físico intenso.
   Subitamente, ele a imaginou na cama, vibrando de prazer nos braços de outro homem e não controlou um grito de raiva e frustração.
   Alex reconhecia sua falta de coerência. Logicamente, não vivera todos aqueles anos sem sexo! Entretanto, nunca procurara uma companheira nem um envolvimento verdadeiro com outra mulher, logo após ter se separado de Carolyn.
   Com o passar do tempo, acabara se envolvendo com mulheres sedutoras e dispostas a levá-lo até o altar, mas ele sempre deixara claro que não aceitaria compromissos.
   Seria uma infantilidade de sua parte imaginar que Carolyn tivesse se fechado em casa, aceitar atenções masculinasde espécie nenhuma. E, no entanto, algo em seu íntimo insistia em achar que Carol seria sua para sempre!
   Pela primeira vez na vida, Alex se via negando um fato claro e evidente. Afinal, o resultado concreto de Carolyn ter vivido e feito amor com outro era Jess. Aquela menina encantadora provava que a mulher a quem sempre julgara apenas sua havia concebido uma filha com um homem sem rosto e sem nome.
   E era uma criança cativante, de olhos muito verdes e temperamento ainda em formação. Nem menina nem mulher em seus treze anos.
   Treze anos?
   Só naquele momento, a importância da idade de Jess conseguiu ser mais forte do que as frustrações sexuais de Alex.
   A menina afirmara ter treze anos, e Carolyn não negara o fato.
   Recuperando a capacidade de raciocinar, ele chegou a uma conclusão que abalava seu mundo tão meticulosamente calculado.
   Há quatorze anos, ele e Carolyn tinham se jogado cegamente em um casamento precipitado. Agora, fazia treze anos que haviam se divorciado. Portanto, ou Carolyn o traíra com o pai de Jess antes do divórcio, ou...
   Alex respirou fundo, tentando se controlar.
   Ou Carolyn fora infiel, ou ele era o pai de Jess!
   Durante alguns minutos, Alex teve a impressão de que parara de respirar. O choque era tão intenso que mal podia absorver a verdade. Então, sentiu uma incontrolável onda de raiva.
   Naquele momento, chegou a sentir ódio de Carolyn, a quem amara como nenhuma outra mulher, sem ter nenhum fato concreto em que se basear. Ainda não sabia se fora traído ou ludibriado.
   A traição já seria mais do que suficiente para encolerizá-lo. Entretanto, se Carolyn o enganara, escondendo que ele iria ser pai, sua fúria cresceria muito!
   Nesse caso, ela lhe negara muitas alegrias. Roubara dele a felicidade de carregar a filha recém-nascida, de vê-la dar os primeiros passos e balbuciar as primeiras palavras.
   Alex sentiu uma penosa sensação de vazio e, pela primeira vez na vida, teve vontade de chorar.
   Jess... Ela seria sua filha? Por que sentira aquela simpatia imediata e inexplicável pela menina, quando jamais se interessara antes por criança alguma?
   Carolyn seria tão maldosa a ponto de agir dessa forma indesculpável? Teria a coragem de esconder-lhe que era pai de uma menina?
   Entretanto, ele não podia esquecer que Carol tinha apenas dezoito anos e era jovem e imatura demais para sua idade. Durante o breve período do casamento, não demonstrara nenhum sinal de que estivesse se tornando adulta.
   Na verdade, Alex lembrava-se quase que unicamente de sua petulância, de suas crises de choro e de suas cenas de ciúme.
   Sem contar as recordações muito mais nítidas de sua paixão na cama. E também de sua insistência em ter um filho.
   Ele precisava saber a verdade sobre quem era o pai de Jess e talvez descobrir a traição de Carolyn.
   Mas como revelar esse segredo sem magoar a menina, sem destruir seu pequeno e inocente mundo?
   Alex não cogitaria em tocar no assunto com a própria Jess, portanto... só restava abordar Carolyn.
   E ela seria honesta o suficiente para contar a verdade que ocultara por treze anos?
   Intuitivamente, sabia que Carolyn não se submeteria a um interrogatório e muito menos admitiria ter traído ou mentido para ele.
   Além disso, uma conversa desse tipo exigia privacidade, e Carolyn afirmara que jamais deixava Jess aos cuidados de outra pessoa.
   Então, Alex lembrou-se de que ela estaria sozinha em casa quando Jess fosse para a escola.
   Subitamente, a impaciência se tornou o sentimento mais forte de Alex. Ele não queria esperar até o início da semana. Não suportava nem sequer aguardar a manha seguinte e, num gesto impulsivo, pegou o telefone.
   Foi preciso muito esforço para não ceder ao impulso de ligar para Carolyn em plena madrugada e exigir que ela lhe dissesse a verdade.
   Suspirando, Alex voltou a deitar-se na cama, resignado-se a esperar. Teria de aguardar pelo momento certo e agir da maneira mais normal possível até segunda-feira.
   Infelizmente, aquela dúvida crucial o manteve acordado pelo que restava da noite, já prestes a dar lugar ao amanhecer.
  
   VIII
  
   Carolyn estava descascando batatas para fazer puré quando soou a campainha, anunciando a chegada de Alex. Trêmula, deixou cair a faca sobre a pia.
   — É Alex! — gritou Jess, eufórica, correndo para fora da copa, onde estava arrumando a mesa. — Eu vou atendê-lo!
   Suspirando, Carolyn tentou concentrar-se de novo em seu trabalho, mas foi em vão. O que estaria acontecendo com ela?
   Na verdade, essa era a pergunta mais tola que jamais fizera a si mesma. Sabia muito bem o que estava errado com ela... Era Alexander Forrester que a transtornava a esse ponto, provocando aquela estranha e irresistível atração.
   — Precisa de ajuda?
   Assustando-se com a voz máscula muito próxima de seu rosto, Carolyn deixou cair novamente a faca.
   — Faça-me o favor de não se aproximar sem fazer barulho outra vez! — explodiu ela, virando-se para Alex a fim de demonstrar sua raiva.
   Infelizmente, a visão daquele homem fascinante a perturbou ainda mais. As roupas informais acentuavam o corpo perfeito de Alex. Carolyn jamais se esquecera dos ombros largos que contrastavam coin as pernas longas, como o ar sensual de um amante sem inibições contrastava com sua aparência sofisticada e urbana.
   Ia ser difícil suportar a tensão da presença de Alex em sua casa. A participação animada de Jess lhe dava alguns momentos de alívio, mas ele estava sempre por perto.
   Felizmente, Carolyn sabia que era uma mulher eficiente, mesmo quando perdia o controle de suas emoções. A refeição dominical estava deliciosa, e seus dois companheiros de mesa não lhe pouparam elogios. Porém, ela quase não tocou em sua comida, no prato, tensa demais para sentir apetite.
   Jess mal podia esperar pelo final do almoço e levantou-se antes mesmo de terminar a refeição.
   — Então? Vamos embora?
   — Espere um momento, garota! Não tem de ajudar sua mãe a tirar a mesa e lavar a louça? — perguntou Alex, também se preparando para participar do trabalho.
   — É... acho que tenho — resmungou Jess, lutando contra o desaponto e a impaciência.
   — Não é preciso — interveio Carolyn. — Eu cuido de tudo... hoje. Amanhã, você volta a assumir seus deveres.
   — Oh, obrigada, mamãe! — exclamou Jess, eufórica. — Vamos logo, Alex!
   —  Tem certeza? — insistiu ele, aproximando-se mais de Carolyn.
   —  Claro que sim. Na verdade, não tenho nada de mais interessante a fazer.
   —  Você podia se juntar a nós para catar conchas — sugeriu ele.
   — Deus me livre!
   A única coisa que Carolyn queria era livrar-se da perturbadora presença de Alex. Precisava tirá-lo definitivamente de sua casa, de sua cabeça e de seu coração!
   — Bem... então, estaremos juntos quando nós dois voltarmos.
   — Juntos? — Ela os fitou, sem esconder o espanto. — Quando voltarem?
   Com um sorriso matreiro, Alex inclinou-se na direção de Carolyn.
   — Vamos ter de lavar as conchas e depois pintá-las. Sem maiores explicações, Alex saiu da sala, seguido por
   Jess. Carolyn permaneceu imóvel, vendo-os ir embora pela porta da frente.
   Então ele pretendia voltar? Sem perceber, Carolyn enfiou as unhas na toalha de mesa.
   — Sua mãe foi bastante camarada em liberar você das tarefas de casa.
   — É... minha mãe é ótima.
   Alex não fez nenhum comentário, perdido em seus pensamentos.
   Essa nova Carolyn era ainda mais fascinante do que a sensual garota por quem se apaixonara à primeira vista. Na verdade, tinha se transformado em uma mulher firme, mas sedutora, e completamente diferente das que namorara naqueles anos de afastamento.
   E essa mulher determinada seria capaz de enganá-lo? Jess poderia realmente ser filha dele?
   Alex pedia a Deus que a menina fosse sua. Mesmo se Carolyn o houvesse enganado e escondido a verdade por todos aqueles anos, gostaria de ser o pai daquela criança encantadora... e poder partilhá-la com a mulher que agora admitia nunca ter deixado de amar.
   E essa garota encantadora transformou sua tarde de domingo em um momento inesquecível. Ao lado de Jess, ele podia voltar a ser criança, a brincar sem autocensura e a sentir-se livre das pressões da realidade.
   Eles conversaram sobre todos os assuntos possíveis, como se fossem amigos há anos, e Alex não queria que aquele contato maravilhoso cessasse.
   Quando a menina sugeriu que fossem pescar à noite, ele recusou. Na verdade, estava pensando em outro tipo de pescaria... quando Jess estivesse em sua própria cama, dormindo como uma boa menina.
   Alex não se conformava em esperar nem mais um dia. As dúvidas o consumiam, e teria de saber a verdade ainda naquela noite. Queria respostas e não desistiria enquanto não as ouvisse dos lábios de Carolyn... antes do domingo terminar!
  
   IX
  
   Risadas entusiasmadas alertaram Carolyn da volta de Alex e Jess. Antes mesmo de vê-los surgir nos limites da janela da cozinha, que abrira para deixar entrar o sol cálido da tarde, ouviu os sons cristalinos de pura alegria de viver.
   Como sempre, o riso de Jess provocava um sorriso em seus lábios. Dessa vez, o som mais grave da risada de Alex causou uma reação menos inocente. Sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo e tentou, em vão, ignorar o desejo que ele continuava a lhe despertar.
   Não era justo que Alex tivesse um efeito tão intenso em suas emoções depois de tantos anos!
   Então, ouviu o som de uma torneira sendo aberta e fechada, e de passos no corredor. Controlando-se, preparou-se para recebê-los com uma expressão de interesse tranquilo.
   — Como foi a procura? Encontraram alguma concha especial?
   — Não — resmungou Jess. — Achamos as mesmas de sempre.
   —  Que pena...
   Sentindo-se mais confiante, Carolyn arriscou-se a encarar Alex e soube, imediatamente, que cometera um grande erro. Ele estava atrás de Jess e, nesse momento de descontração, fitava a menina com amor.
   — Mas nós esburacamos um pedaço enorme da praia. Não foi assim, garota?
   — É verdade! — O entusiasmo de Jess retornou com pleno vigor. — E agora eu e Alex estamos famintos, mamãe! Não é verdade?
   Alex sorriu para Carolyn, e, mais uma vez, ela reconheceu sua fraqueza diante da atração daquele homem.
   O fascínio de Alex não era justo... chegava a ser quase um atentado ao pudor!
   — Otimo — falou Carolyn, surpresa com o tom calmo de sua voz. — Vocês não foram os únicos a passar toda a tarde ocupados. Preparei sanduíches, salada e até sobrou tempo para fazer uma torta de morangos. Vão lavar as mãos enquanto eu arrumo a mesa.
   Finalmente o silêncio dominou a casa. Jess fora dormir.
   Depois do lanche, Alex e a menina tinham passado horas pintando figuras estranhas nas conchas e rindo sem parar. Carolyn também teria relaxado, colocando os pés sobre uma banqueta, à espera da hora de ir para a cama, se não fosse a tensão provocada pela presença de Alex em sua casa.
   Aliás, ele se acomodara na poltrona favorita de Carolyn, colocara os pés na sua banqueta e estava lendo as suas revistas!
   Diante da possibilidade de arrancar a revista das mãos dele e depois empurrá-lo para fora de sua casa, Carolyn preferiu não agir. Na verdade, procurava um modo educado de mandá-lo embora.
   Como era de se. esperar, o silêncio foi se tornando tenso e desagradável. Quando Alex fechou bruscamente a revista, Carolyn deu um salto na cadeira, como se tivesse ouvido o estrondo de uma bomba.
   — Você me assustou — murmurou ela, sem graça, ao perceber que Alex a fitava com uma expressão interrogativa.
   Sem fazer nenhum comentário, ele cruzou a sala e sentou-se ao lado de Carolyn.
   —  Tem medo de mim, Carol?
   —  Medo? — Ela falava rapidamente a fim de esconder o embaraço. — É claro que não. Imagine se teria!
   Alex segurou-lhe delicadamente o rosto, forçando-a a encará-lo.
   —  Eu jamais a magoaria.
   Apesar de baixa e suave, a voz de Alex refletia emoções tumultuadas e intensas.
   — Eu sei...
   Desviando os olhos, Carolyn tentava pensar com coerência, mas só conseguia se concentrar no prazer provocado pela doce carícia dos dedos de Alex em seu rosto.
   — Alexander...
   —  Sim, Carol?
   Ao ouvir seu nome num murmúrio apaixonado, Carolyn perdeu a capacidade de se controlar. Era perigoso demais ceder à sedução, mas ela ansiava pelas carícias que conhecera no passado e virou o rosto para seus lábios se encontrarem.
   Carolyn soube que não teria força para resistir no instante em que suas bocas se uniram.
   A chama voraz da paixão, que sempre nascera quando eles se tocavam, parecia estar ainda mais ardente e devastadora. Como num passe de mágica, ela se esqueceu da necessidade de ser prudente e de se defender de sofrimentos futuros.
   O perigo não tinha a menor importância... aliás, nada importava, a não ser esse homem sensual, que a fazia sentir-se viva, que a transformava em uma mulher realizada e feliz.
   Sem sequer esboçar um protesto, Carolyn se entregou ao beijo, que se tornava cada vez mais possessivo e exigente. Voltou a ser a jovem apaixonada do passado, que vibrava ao toque ávido das mãos de Alex. Parecia-lhe ter dezoito anos novamente, esperando ser possuída pelo homem que amava.
   Ela também não protestou quando Alex a puxou do sofá para o tapete em frente à lareira. A paixão guiava seus gestos e despiu-o com a mesma urgência com que suas roupas eram jogadas pelo chão da sala.
   Nenhum dos dois falava. Não havia necessidade de palavras, pois seus corpos se exprimiam com eloquência. Era o momento de agir e sentir. Carolyn notava a volúpia das mãos de Alex redescobrindo seu corpo e arqueou-se, oferecendo-lhe sua nudez.
   O desejo era tão intenso que Alex não podia esperar e possuiu-a com uma pressa quase desesperada.
   O prazer de Carolyn ao sentir Alex dentro de seu corpo foi arrebatador, e ela não controlou um gemido.
   Imobilizando-se, Alex a fitou, assustado e confuso.
   —  Carol? Sinto muito, eu... só agora percebi que você não faz sexo há muito tempo.
   —  Não se preocupe — murmurou ela, vibrando de prazer. — É tão maravilhoso...
   — É... como voltar para casa — sussurrou ele, acariciando os seios rijos de Carolyn.
   Como acontecera no passado, Alex se maravilhou com o abandono dela, que exigia sempre mais prazer. Mulher alguma conseguia ser tão inocente e tão ousadamente sensual.
   Os corpos enlaçados se moviam, ardentes, buscando a consumação de todos os desejos. Carolyn tentava conter os gemidos e os suspiros de prazer, mas não teve forças. No momento do clímax, gritou o nome dele.
   Aconchegada entre os braços fortes de Alex, ela se deixou levar pela sensação de plena felicidade. Queria sentir-se sempre protegida e amada como naquele momento.
   Alexander... ele era o único homem que amara e que amaria pelo resto de sua vida. Reconhecia que, num impulso de paixão, arriscara a paz obtida a tão duras penas, mas pouco se importava.
   Abraçado a Carolyn, Alex pensava na beleza daquele momento de paz e saciedade, após um encontro apaixonado, que parecia perfeito demais para ser real.
   Ele descobrira que nenhuma outra mulher o satisfazia como Carolyn, mas essa vez fora ainda mais gratificante.
   E, no entanto, ela o traíra ou o enganara!
   Subitamente, a força dessa verdade penosa o atingiu com um impacto quase físico. Sua única vontade era afastar-se o mais depressa possível dela, para sofrer em solidão e silêncio.
   Só que homens fortes não fugiam da verdade,.e sim lutavam pelo que lhes pertencia.
   Erguendo-se ligeiramente, Alex virou a cabeça a fim de encarar o rosto ainda corado de paixão da única mulher a quem amara de verdade,
   — Você não voltou a se casar?
   Embora a voz parecesse suave, Carolyn o fitou com receio.
   — Não... — Ela sentiu a garganta seca, preparando-se para um confronto penoso. — Como soube?
   — Foi uma dedução bastante simples. Vi seu nome, Carolyn Forrester, na capa das revistas.
   — É claro.
   Carolyn fechou os olhos, mas a voz alterada de Alex fez com que os abrisse rapidamente.
   — No calor do momento, nenhum de nós dois pensou em sexo seguro. Se você concebesse... o que iria me dizer desta vez?
   —  Como? — Ela estremeceu, — Sobre o que está falando, Alexander?
   —  Sobre Jess. Ela é minha filha, não?
   Alex nunca se sentira tão cansado em toda sua vida.
   — Não!
   — Não minta para mim, Carol.
   Indiferente a sua nudez, Carolyn levantou-se do chão, expondo o corpo de curvas perfeitas, agora em uma postura de desafio.
   — Eu não estou mentindo. Jess não é sua filha. Angustiado, Alex fechou os olhos. Chegara o momento de ouvir a verdade cruel.
   — Eu gostaria, do fundo de meu coração, que ela fosse sua. Então, Carolyn não o enganara? Sua voz era sincera demais para estar mentindo.
   — Ela é ilegítima?
   — De modo algum! — exclamou Carolyn, indignada.:— Como ousa sugerir essa barbaridade?
   —  Ouso tudo porque preciso saber a verdade!
   Ele estava se sentindo profundamente frustrado por não ser o pai de Jess. Aprendera a amar aquela criança encantadora como se ela fosse sua filha.
   — E por que precisa saber a verdade? — perguntou Carolyn agressivamente.
   —  Porque eu adoro essa menina...
   Sempre incapaz de expor suas emoções mais íntimas, Alex surpreendeu-se com suas próprias palavras. Já não se importava de ficar vulnerável diante de uma mulher.
   —- É verdade? — A expressão de Carolyn revelava ternura e felicidade. — Oh, Alexander!
   — Quem... — Ele hesitava, ávido pela verdade e, ao mesmo tempo, com medo da revelação. — Quem é o pai de Jess?
   — Um homem que eu nunca encontrei.
   —  O quê? — Alex a encarou, confuso. — Não faz o menor sentido!
   — Não faz porque você não conhece os detalhes da história de Jess.
   Ainda raivoso e confuso, Alex forçou-se a manter o controle, a fim de não gritar com Carolyn.
   — Está bem. Que tal esclarecer esse assunto?
   Naquele instante, Carolyn se deu conta de que estava nua e andando de um lado para o outro da sala.
   — Oh, céus! Preciso me vestir!
   Mas Alex a segurou pelo pulso, impedindo-a de apanhar as roupas jogadas pelo chão.
   — Não vai fazer nada antes de me contar tudo.
   —  Eu vou contar, mas temos de nos vestir. — O olhar dela era de apelo. — E se Jess acordar? Gostaria que nos visse... assim?
   — Está certo.
   Com a habitual rapidez, Alex se aprontou bem antes de Carolyn voltar para a sala. Enquanto a esperava, sem conter a impaciência, preparou um bule de café, sabendo que ambos precisariam de energia para levar ao fim aquela conversa.
   Quando Carolyn retornou do quarto, Alex teve certeza de que conheceria toda a verdade. A expressão dela era de profunda sinceridade. Só não sabia que ficaria ainda mais confuso.
   — Jess sabe que não sou sua mãe biológica.
   — O quê?
   — E uma história bastante triste e longa. — Carolyn sorriu ligeiramente diante da expressão de espanto de Alex.
   —  Sem problemas. Eu não tenho mesmo nada de urgente a fazer.
   Percebendo a relutância de Carolyn, Alex acomodou-se em uma poltrona, bastante longe dela, e serviu-lhe uma xícara de café.
   — Bem... depois de nosso divórcio, eu decidi voltar para a faculdade, a fim de receber meu diploma.
   Alex franziu a testa, sem entender a possível conexão entre o parentesco de Jess e a educação acadêmica de Carolyn.
   —  Não se impaciente, Alexander. Como eu queria um diploma para dar aulas no curso primário, fui trabalhar em uma creche gratuita, para mães que não podiam pagar.
   Carolyn parou de falar, e seu olhar se perdeu em algum ponto da sala, como se estivesse revivendo o passado.
   — Pouco depois de ter começado a trabalhar, conheci uma jovem com uma filhinha de apenas dois meses.
   — A criança era Jess?
   — Sim... Ela era tão linda e delicada! Parecia uma boneca. — Lágrimas começaram a correr pelo rosto de Carolyn. — Judy, a mãe de Jess, era uma moça tímida, sozinha no mundo e amedrontada com o futuro. Logo ficou minha amiga, pois precisava demais de alguém com quem pudesse falar.
   — Jess era ilegítima?
   —  Oh, não! Judy e o pai de Jess haviam se casado. Na verdade, tinham fugido para se casar, num ato de desafio, pois os pais dele desaprovavam a união. Achavam que ela não estava à altura do filho porque vinha de uma família instável e cheia de problemas graves.
   Carolyn calou-se a fim de tomar mais um gole de café. Alex não a apressou a continuar, sabendo quanto lhe custava falar sobre aquele assunto.
   — Judy contou-me que eram muito felizes e o casamento seria um sucesso, a despeito das objeções da família do marido. E disse que ambos ficaram eufóricos quando Jess nasceu.
   O suspiro profundo de Carolyn alertou Alex de que o pior estava por vir.
   —  O marido de Judy queria que ela mesma cuidasse da filha e insistiu para que não voltasse a trabalhar. Para manter a pequena família, ele arrumou um segundo emprego e, como não tinham carro, ia a pé de um trabalho ao outro. O cansaço logo aumentou, e ele não conseguia se manter atento. Foi atropelado ao cruzar uma rua movimentada. A polícia nunca encontrou o culpado.
   — Oh, Deus! E o que aconteceu com Judy e com Jess?
   — Ficaram sozinhas, sem família e sem amigos em quem pudessem se apoiar. Judy precisou voltar ao trabalho e deixar Jess na creche. Diante de tantas dificuldades, eu lhe propus que morasse comigo... na casa que você foi tão generoso em me dar.
   — Não me surpreendo. — Ele sorriu, com ternura. — Você sempre teve um coração bom demais. Mas isso não explica por que Jess a chama de mãe.
   — Judy era uma jovem frágil, estava sempre doente. Logicamente, preocupava-se com o futuro da filha e pediu-me permissão para me nomear guardiã de Jess, caso ela morresse antes da maioridade da menina. Eu... concordei.
   — E Judy morreu?
   — Sim... ela... Oh, Alex! Acho que Judy não suportava viver sem o homem que amou!
   Carolyn olhou ao seu redor, como se visse aquela sala pela primeira vez.
   — Esta casa sempre me pareceu um lugar feliz e cheio de esperança. Quando os Peterson decidiram vendê-la, há dez anos, vendi a outra e a comprei, decidida a ganhar meu sustento sem precisar sair e deixar Jess com estranhos. — Carolyn soluçava. — Fiz o melhor que pude...
   Com toda a rapidez, Alex levantou-se da poltrona e tomou Carolyn nos braços.
   — Você fez um trabalho maravilhoso, querida. Jess é uma criança feliz e sem problemas. Sinto-me orgulhoso de sua coragem.
   — Mas você não compreende! — exclamou ela, soltando-se dos braços de Alex. — Jess tem seu sobrenome. Sem qualquer escrupulo, usei seu nome e sua influência para poder adotá-la. Apesar de sentir ódio de sua dedicação ao trabalho, não hesitei em me aproveitar de sua posição para alcançar o que queria.
   —  Ótimo — disse Alex, rindo da evidente surpresa de Carolyn.
   — Então... não ficou irritado?
   — Muito pelo contrário, querida. — Num impulso, tomou o rosto dela entre as mãos. — Ah, Carol! Tenho sido tão idiota! Um tolo egoísta e cego. Desperdicei todos esses anos satisfazendo minha ambição, certo de que atingir o auge de minha carreira era o mais importante de tudo. Agora que é tarde demais, vejo que o sucesso só existiu quando eu tinha seu amor.
   — Quem disse que é tarde demais? — murmurou ela, com os olhos brilhando de amor e ternura.
   —  O que está me dizendo, Carol? Eu gostaria que fosse verdade, mas entendo...
   — Lembra-se do que me disse momentos atrás, que eu não fazia sexo há muito tempo?
   Alex concordou com um gesto de cabeça, emocionado demais para falar.
   — Pois faz muito mais tempo do que você imagina. Eu te amo, Alex. Sempre te amei e não conseguiria me entregar a outro homem.
   Fechando os olhos, Alex tentava conciliar duas emoções intensas. Sentia-se tão eufórico que queria gritar ao mundo, em voz alta, quanto estava feliz. Ao mesmo tempo, reconhecia a humildade que devia ter diante daquela mulher maravilhosa.
   — E eu nunca amei ninguém a não ser você, Carol! Quero... você me dá a honra de se casar comigo de novo?
   Carolyn ergueu o queixo e o fitou com firmeza.
   — Tem certeza absoluta do que está pedindo, Alexander? Se nos casarmos de novo, não o deixarei mais escapar de minhas garras, amor!
   — Espero que não... porque eu também a prenderei a meu lado para sempre.
  
   — Eu não disse? É fantástico, papai!
   Alex sentiu seu coração se encher de amor ao ver o rosto animado da menina que muito em breve seria sua filha adotiva.
   Haviam se passado três meses desde que Alex se livrara do orgulho e abrira seu coração a Carolyn. Noventa dias repletos de amor e alegria.
   E logo toda sua vida seria perfeita como nesses dias de sonho...
  
   FIM