Kathleen Eagle [ Homens Sedutores 1 ] - Um autêntico cowboy



 Um autêntico cowboy
  All-around cowboy blues
  Kathleen Eagle
  Homens Sedutores 1
  
  
   RESUMO: Ted Lassiter, famoso cowboy, deixara de competir havia algum tempo para administrar sua própria fazenda. No entanto, suas economias estavam no fim, pois nesse ano o inverno intenso castigara os fazendeiros. Ted precisava de uma outra fonte de renda. Foi quando recebeu uma proposta para trabalhar como modelo de roupas country. A idéia não lhe agradava muito, mas apresentava alguns aspectos bastante atraentes. O primeiro era o alto cachê. O segundo, um reencontro com Abigail, alguém muito doce, que nunca fora capaz de esquecer, mesmo depois de dez anos...
  
    Homens Ardentes e Inesquecíveis
   DEFINIÇÃO (de acordo com o dicionário): HOMEM — alguém que possui as qualidades consideradas como características do sexo masculino... em grande quantidade.
   DEFINIÇÃO (de acordo com todas as mulheres): HOMEM — alguém que jamais revela o que está sentindo, mas espera que se adivinhem suas emoções.
   Os homens segundo Abby Van Patten.
   "Eu tenho de admitir... cowboys são o meu ponto fraco, apesar de estarem sempre cavalgando para o horizonte distante, deixando-nos com o coração partido. E Beau era um dos mais difíceis de resistir. Alto, musculoso e perfeito. Mas ele não se considerava bastante bom para mim quando, na verdade, eu não era boa o bastante para ele".
  
   Os homens segundo Carolyn Colei
   "Homens! Eles reaparecem repentinamente em nossas vidas, esperando que nós abandonemos tudo para recebê-los. Basta ver o caso de meu ex-marido. Por tempo demais, Alexander Forrester foi casado com seu trabalho, esquecendo-se da existência de sua esposa, eu... que o aguardava em casa. Agora, afirma-me que mudou, e todos os meus instintos me dizem para acreditar em suas palavras. Mas será que estou cometendo um grande erro?"
   Os homens segundo Catherine Courlaine:
   "Sempre sonhei com um homem moreno, forte e misterioso que surgiria em um magnífico cavalo branco para me salvar. Então encontrei Tamar Fallah Haj. Foi decididamente um caso de tomar cuidado com o que se deseja..."
  
  
PRÓLOGO
  
   Ted Lassiter passou a perna por cima do lombo do cavalo e sentiu a bota afundar na neve. Era um movimento banal, que ele se acostumara a repetir dez, vinte e até cinqüenta vezes por dia, quase todos os dias de sua vida.
   Mas, ultimamente, era um movimento que provocava uma dor incomoda em suas juntas, em especial nos dias muito frios e úmidos. Na verdade, preferia passar o tempo todo em cima de uma sela, sem nunca precisar descer.
   Ele sempre se sentira melhor cavalgando do que caminhando. Em cima de um cavalo, um homem é o rei de seu mundo. Quando andava, acabava com bolhas nos pés. E o frio excessivo e inesperado desse mês de abril fizera Ted lembrar-se de todas suas dores.
   Entretanto, esses males físicos não tinham a menor importância diante dos desastres provocados pelo clima hostil. Com as mãos cobertas por grossas luvas, afastou o gelo que cobrira mais um bezerro morto.
   Aquela maldita tempestade de neve, apesar de já estarem na primavera, coincidira com a época do nascimento dos bezerros e provocara uma verdadeira calamidade. Ninguém se importava muito com as nevascas de inverno, sempre violentas em South Dakota, mas significavam o pesadelo de todos os fazendeiros quando vinham no início da primavera.
   E esse pequeno bezerro branco e preto era a gota d'água! Suas reservas financeiras tinham atingido o ponto mais baixo desde que começara aquela empreitada, e teria de pedir dinheiro emprestado ou encontrar uma outra fonte de renda.
   A idéia de pedir empréstimo lhe provocava arrepios de repulsa. Infelizmente, também não lhe agradava trabalhar à noite, em outras fazendas, ganhando por hora, quando necessitava de seu sono para agüentar o dia de labuta árdua.
   Uma outra opção lhe fora oferecida, e o pagamento parecia bom demais para um trabalho que não exigia esforço físico nem grandes dotes intelectuais. Era preciso ter músculos bem desenvolvidos, mas apenas em função das aparências.
   Na verdade, a palavra-chave era a aparência! Ganhar um bom dinheiro para apresentar roupas lhe parecia uma completa idiotice. Aceitara fazer algumas propagandas nos dias em que participava profissionalmente do circuito de rodeios, mas costumava recusar as que não lhe agradavam. Bancar o modelo não combinava nada com ele!
   Mas essa proposta apresentava alguns aspectos atraentes que mereciam ser levados em conta. Voltando a montar em seu cavalo negro, Ted começou a analisá-los ainda mais uma vez. O primeiro era o dinheiro fácil, e ele estava em uma situação econômica precária! Se o preço fosse adequado, ele até seria capaz de engolir o orgulho e vestir-se como um desses cowboys de revista. Pelo menos, não tinham pedido que posasse nu!
   O segundo aspecto era a recordação de alguém muito doce. Em sua carta, Abigail Van Patten lhe perguntava se ainda se lembrava dela. Ted deu um sorriso melancólico, enquanto soltava as rédeas do cavalo, permitindo que o animal escolhesse o melhor caminho entre as valas cobertas de gelo até alcançar o alto da colina, onde o vento já soprara a neve para algum outro lugar.
   Exatamente como Ted costumava viver, havia alguns anos, como que sendo levado pelo vento, de Dakota para o Texas, de um minuto para o outro.
   Tinham se passado dez anos desde que a vira em um aeroporto de Colorado Springs. Era o tipo de encontro que só essas ventanias, senhoras do destino de algumas pessoas, poderiam proporcionar. Apesar de ser apenas mais um imprevisto em uma vida sem qualquer programação rígida, Ted lembrava-se muito bem daquele momento.
   Ele realmente não esquecera nenhum detalhe. Lembrava de cada um dos fios dos abundantes cabelos ruivos, cada centímetro da pele sedosa e cada movimento gracioso. Bastaram cinco semanas e todas as minúcias ficaram gravadas em sua mente.
   Ted chegara à conclusão de que nunca a esquecera porque ela fora embora e o abandonara. Mas o tempo que haviam vivido juntos... nenhum homem deixaria de se lembrar. Ainda conseguia ouvir os suspiros doces de Abigail.
   Ou ele estaria apenas ouvindo o assobiar do vento? Os dois sons eram igualmente difíceis de capturar.
   Provavelmente, você não se lembra mais de mim. Ao ler essas palavras, Ted não contivera o riso. Abigail sabia muito bem que ele nunca a esqueceria. Um homem jamais se esquece da primeira e única mulher que despedaçou seu coração!
   Mas eu tenho lido a seu respeito e sei que, desde nosso último encontro, você realizou seu grande sonho de vencer o campeonato nacional de rodeios. Deve ter se sentido eufórico!
   Sem dúvida alguma! Ele conseguira a fivela dourada de campeão, exatamente como lhe dissera que o faria!
   Gostaria de saber se estaria interessado em emprestar seu nome... Emprestar seu nome? Na verdade, Abigail estava querendo que ele o vendesse. Era uma situação realmente cômica, pois sonhara, num passado distante, em lhe pedir que ô aceitasse. Nunca chegara a falar sobre o assunto, pelo menos não o fizera de uma forma direta. Entretanto, confessara seus sentimentos mais íntimos. E também os demonstrara com seu comportamento. Os sonhos de um cowboy eram muito semelhantes a seu dinheiro. Fácil de ganhar, fácil de perder. Tivera mais sucessos do que fracassos e não ia começar a chorar por causa de sonhos não realizados. Não seria nada mau se a visse de novo, mas preferia não pedir favores para não ficar em dívida!
   Ted tentava se convencer de que não se tratava de favor nenhum, e sim de uma transação comercial, pura e simples! Ela o queria como modelo para mostrar sua coleção de fantasias de cowboy, também desejava seu nome para valorizá-las e estava disposta a pagar por isso. Se o preço lhe agradasse, talvez aceitasse a oferta de Abigail.
   Ele conhecia maneiras muito mais difíceis e duras de ganhar dinheiro!
  
  
   CAPÍTULO I
  
   — Tenho uma surpresa para você! - Jackie Turnquist encarou sua sócia com uma expressão suspeita, muito semelhante à de uma criança que fez alguma arte. Com um olhar para a porta as suas costas, indicou que deixara a surpresa na loja, situada na frente do escritório.
   — Encontrei nosso autêntico cowboy de rodeio! — exclamou ela, aproximando-se da escrivaninha de sua sócia na loja de roupas.
   Abigail Van Patten aproveitou a interrupção de Jackie para relaxar. Precisava dar um descanso a sua mente após tantas horas de trabalho com números!
   — Ele é realmente um artigo genuíno?
   — Tem o rosto perfeito, o corpo apropriado e o troféu de vencedor de rodeios, a tão famosa fivela dourada.
   — Por acaso, o preço também é adequado para nós?
   — Bem... digamos que o sr. Certinho não é barato, mas vale o preço que pede. Além disso, já está aqui, em pessoa!
   Abby afastou os cabelos lisos do rosto que, àquela hora do final da tarde, revelava sua exaustão.
   — E aposto que está louca para me apresentar a essa maravilha, acertei?
   — Na verdade, você já o conhece...
   Curiosa, Abby ficou à espera de que a sócia lhe revelasse o nome. Conhecera dezenas de cowboys desde que ela e Jackie tinham aberto sua confecção de roupas de estilo country. Entretanto, ao contrário da amiga, não se lembrava de detalhes, nem gravava suas histórias particulares.
   Conhecendo-a bem, sabia que Jackie só lhe revelaria o nome depois de ter enunciado toda a lista de feitos heróicos daquele cowboy em particular e preparou-se para esperar.
   Mas Jackie recuou e, cruzando os braços, assumiu uma pose que indicava problemas sérios.
   — Você assinou a carta que lhe enviamos, oferecendo-lhe o emprego. — O olhar de Jackie parecia pedir desculpa e, ao mesmo tempo, desafiar Abby. — Ou melhor... seu nome foi assinado.
   Abby ficou tensa. Ela jamais assinava nada sem ler antes!
   — Nós colocamos vários anúncios em jornais e revistas. Não enviamos nenhuma carta pessoal!
   — Mas queríamos um cowboy autêntico, um profissional do ramo, que pertencesse à Associação Nacional de Campeões de Rodeios. Você sabe que não são fáceis de encontrar...
   — Então decidiu enviar cartas pessoais? — interveio Abby.
   — Mandei apenas uma. Apenas uma
   Naquele instante, Abby pressentiu o perigo. Só existia um nome que não confundiria com nenhum outro. Só um homem cuja identidade nunca revelara e não tivera notícias dele desde que abrira sua loja. Aquele sobre o qual evitava falar e, uma única vez, mencionara-o. Apenas mencionara em uma conversa banal!
   — Você o conhece pessoalmente.
   — Está me dizendo que escreveu a esse homem e assinou meu nome?
   Abby não sabia se começava a gritar de ódio, se estrangulava a sócia ou simplesmente continuava a fitá-la, boquiaberta e sem reação.
   — Exatamente — respondeu Jackie, em voz baixa.
   — E o que lhe escreveu?
   — Foi uma carta bastante profissional. Você dizia... — Jackie deu um sorriso desapontado — que o havia conhecido fazia muito tempo, mas esperava que ele se lembrasse de seu nome.
   Abby suspirou, desanimada.
   — E esperava que ele tivesse se recuperado do machucado...
   — Que machucado? — indagou Abby, perplexa.
   — Apenas uma perna quebrada, querida. Como acompanho a carreira de todos os cowboys, soube que ele parou de participar de rodeios dois anos depois de ter vencido o campeonato nacional. Teve um confronto brutal com um potro, mas não ficou com nenhuma marca. Vá vê-lo, Abby. Aposto que a está esperando... ansiosamente.
   Fechando os olhos por um momento, Abby o viu. Aquela imagem ficara gravada em sua mente, e jamais esquecera o sorriso irresistível, o olhar fascinante, e agora... ele a esperava na outra sala!
   — Não acredito que você fez mesmo isso, Jackie!
   — Eu precisava fazer, Abby! Esse homem é perfeito, e trata-se de uma transação comercial, não de um pedido a um amigo. Ele quer o emprego, e nós o pagaremos pelas horas de trabalho.
   Jackie sorriu para a sócia, como se lhe pedisse para controlar a raiva.
   — Por favor... fique do meu lado e vá conversar com ele. Na verdade, Abby deixara de ser uma pessoa sensata e racional ao aceitar a sociedade com Jackie Turnquist. Entretanto, a loja das duas fora um sucesso e continuava a se expandir com uma incrível rapidez.
   — Se você não fosse um gênio em marketing, Jackie...
   — Tenho mais coragem do que cabeça — interrompeu-a Jackie, empurrando a amiga para a porta do escritório. — Depois que vocês dois se cumprimentarem e começarem a se entender às mil maravilhas, confessarei meu ardil. Aposto que todos nós vamos rir muito, e tudo ficará bem. Ah! Prometi que o levaremos para jantar.
   — Tenho outro compromisso — resmungou Abby, tentando ajeitar melhor os cabelos.
   — Não tem! Verifiquei sua agenda. — Jackie ajudou Abby a vestir o casaco do conjunto cinza. — E está linda como sempre.
   — E daí?
   — Trata-se apenas de uma observação de minha parte. — Jackie sorriu, sabendo que fora perdoada, e seus olhos voltaram a brilhar. — Ele é perfeito! Exatamente o que precisamos, Abby... o rei dos cowboys!
   — Esse era Roy Rogers! — resmungou Abby, abrindo a porta que dava para a loja.
   Ela respirou fundo e avançou dois passos. Não foi preciso nem sequer procurá-lo, pois o homem parado junto da caixa registradora atraía seu olhar como se fosse um ímã.
   Perfeito... fora exatamente o que pensara quando o vira pela primeira vez, havia dez anos. Um cowboy autêntico e irresistível!
   Alto, magro e com um tom de pele dourado pelo sol. Lembrava-se da sinuosidade com que ele se movia, como se fosse um leão da montanha. Sem nenhum esforço aparente, apanhara a pasta que Abby deixara cair no meio do terminal do aeroporto. Dezenas de pessoas haviam passado a seu lado, sem lhe lançar sequer um olhar. Ted Lassiter parara a fim de ajudá-la.
   Agora se dava conta de que ele não mudara quase nada. Talvez estivesse um pouco mais magro e com algumas linhas a mais no rosto másculo. Quando Ted ergueu o olhar e a fitou, percebeu que também adquirira mais autoconfiança, e seus fascinantes olhos azuis refletiam segurança.
   — É bom ver você — disse Abby, estendendo-lhe a mão. Como sempre acontecera antes, ela se sentiu envolvida por um olhar intenso demais, que parecia tirar-lhe todas as forças. Se quisesse sobreviver, teria de evitar todo tipo de contato físico com Ted Lassiter!
   — Concordo plenamente — falou ele. — Receber uma carta sua foi uma surpresa muito agradável.
   — Bem, eu... — Ela sorriu, embaraçada. — Eu pensei muito em você. Conseguiu o que sempre almejou, não? Provar que era o melhor de todos os cowboys do circuito nacional de rodeios.
   Ted riu, abaixando a cabeça, como se estivesse envergonhado. Abby teve certeza de que enrubescera.
   — Vi sua foto em uma dessas revistas especializadas em cobertura de rodeios.
   — E você também, realizou seu sonho, certo? Disse que queria abrir uma loja de roupas. — Ele examinou as prateleiras por toda a volta da loja. — Só não me disse que venderia também botas de cowboy. Onde estão as suas?
   — As minhas?
   — É impossível que seu pé tenha crescido! Refiro-me às que eu lhe dei, lembra-se?
   — Bem... elas devem estar em algum canto. — Ela se recordou dos sonhos que ambos haviam partilhado. — Mas nunca consegui meu cavalo.
   — E por que não?
   — Continuo com o mesmo problema daquela época. Não tenho lugar para manter um cavalo.
   — Então está falando com a pessoa certa. Espaço é o que não falta em South Dakota. — Ele viu uma pessoa parar à porta e recuar ao ver a tabuleta que dizia: "Fechada para o almoço". — Você tem uma loja bem bonita, e... achei que também a encontraria casada, mas Jackie me colocou a par de tudo.
   — Eu não tive tempo para cuidar disso — murmurou Abby, embaraçada.
   — Nem eu. Passaram-se dez anos, mas também estive realmente muito ocupado.
   Subitamente, Abby decidiu encerrar aquela conversa sobre o passado.
   — Imagino que essa idéia maluca o tenha deixado um tanto surpreso, Ted. Não quero que se sinta na obrigação de aceitar, em função de nossa antiga... — ela hesitou, antes de prosseguir, com firmeza — amizade. Sei que deve ser uma época do ano muito cheia de compromissos para você.
   — Ah, sabe mesmo? — Ele a fitava, com uma expressão maliciosa.
   — Bem... — Abby corou, embaraçada. — Acho que não sei. De qualquer forma, foi uma idéia repentina, e... agora que não participa mais de rodeios, talvez não se interesse...
   — Eu ainda sou uma atração em torneios de laço, não desapareci do circuito. Algumas pessoas lembram-se de mim. — Ele parecia divertir-se com o embaraço de Abby. — Não era isso que vocês queriam?
   — Acho que me expressei mal. Sei que ainda é um nome famoso e...
   — Ouça! Você e sua sócia me ofereceram um emprego, certo?
   — Eu... nós... é claro que sim.
   — Já fiz algumas propagandas e sei como funcionam. Não estão me pedindo nada, além de dizer que gosto das roupas de sua marca, não é? Pois gosto mesmo!
   — Tem certeza? Já deu uma boa olhada pela loja?
   — Claro.
   Os dois se fitaram, relembrando um momento do passado, mas Abby desviou rapidamente o olhar.
   — Sua sócia concordou com o que eu pedi. E você?
   — Jackie está redigindo o contrato agora mesmo. Entretanto, precisa saber que não se trata apenas de uma propaganda rápida. Nossa oferta de trabalho envolve agir como modelo.
   — Eu sei. — Ted deu uma gargalhada. — Mas não esperam que seja modelo para vender roupas íntimas, não é?
   — Nosso catálogo tem alguns pijamas — respondeu ela, também rindo.
   — Estampados com bichinhos? — perguntou ele, com uma expressão de fingido horror. — Deus me ajude!              
   — São de seda...
   Ted a fitou, com uma expressão quase melancólica.
   — A primeira vez que eu toquei em algo feito de seda... — Ele riu ao ver que Abby corava novamente. — Achei lindo, suave como...
   — Diga qual é seu nome completo, e mandaremos bordar as iniciais — interrompeu-o Abby, perturbada. — É um toque de classe, concorda?
   — E eu fico com as peças... de graça?
   — Sim. Queremos que use nossa marca em todos os lugares aos quais comparecer. — Com um gesto amplo, ela mostrou as peças expostas na loja. — Estamos contratando você para nos ajudar a vender mais, entende?
   — Mas vocês também têm roupas femininas, certo? Quem irá ser a modelo? Alguma Miss América? Cuidado com a beldade que colocar ao alcance de minhas mãos!
   Abby ignorou a brincadeira de Ted, tentando manter a conversa em um tom estritamente profissional.
   — Não se preocupe com esses detalhes. Precisávamos apenas de uma personalidade do mundo dos rodeios, por motivos óbvios. Os outros participantes serão modelos profissionais.
   Naquele instante, Jackie retornou à loja, com o contrato pronto.
   — Onde eu assino? — perguntou Ted, tirando a caneta do bolso da camisa.
   — Gostaria de levá-lo para seu advogado? Depois, está convidado a jantar conosco.
   — Não, obrigado. Aprendi a contar e sei assinar meu próprio nome — disse ele, sempre rindo. — E costumo pagar minhas refeições.
   Depois de assinar o contrato, em cima do balcão da loja, ele voltou a encarar Abby.
   — Como pode ver, meu nome é apenas Ted Lassiter, mais nada.
   — E é um nome famoso! — exclamou Jackie, eufórica, estendendo a mão para cumprimentá-lo pelo contrato assinado.
   — Sei de todas suas vitórias em rodeios e quanto é respeitado! Caso não goste de alguma de nossas roupas, nós a trocaremos por outra que lhe agrade mais...
   — Acho bastante justo.
   — Então... — Abby interveio, ansiosa por encerrar a conversa.
   — Fico feliz que tenhamos concordado em todos os pontos.
   — Nem foi tão complicado assim, não acha?
   "Complicado" não era a palavra adequada para exprimir aquela situação!
   Havia dez anos, Ted Lassiter tinha feito Abby perder a cabeça e o rumo de sua vida. Na verdade, ela chegara a acreditar que não se devia planejar nada além do próximo dia.
   Abby mergulhara de cabeça no mundo sem horários ou rotinas de Ted Lassiter, durante um maravilhoso e romântico verão. Mas até mesmo uma garota apaixonada e fascinada por fantasias de cowboys valentes teria de encarar a realidade e descobrir, rapidamente, que aquele oeste bravio era apenas um sonho. Ninguém vivia nesse lugar idealizado.
   Ninguém a não ser os cowboys renitentes e teimosos como Ted. Acreditara em suas juras de amor, mas, no fundo, sempre soubera que ele amaria mais os rodeios e não teria nunca a possibilidade de sequer competir com essa amante exigente.
   Na verdade, Abby não levara muito tempo para descobrir essa realidade. Em nome da precisão, tinham sido apenas cinco semanas! Trinta e cinco dias gloriosos, que significavam quase uma eternidade para um homem que jamais olhava para um calendário e não possuía nem sequer um relógio!
   Ted levava a vida de acordo com as estações e a planejava em um mapa rodoviário que parecia prestes a se despedaçar. Algumas cidades estavam marcadas com um círculo feito a lápis e com a data do rodeio. Seu único plano mais rígido era participar das finais do campeonato nacional, e, para isso, teria de colecionar alguns troféus, uma série de prêmios em dinheiro e acabaria sendo um campeão.
   Abby se ligara a ele em circunstâncias tão insensatas quanto seu romance destinado a um final infeliz!
   Ela nascera e vivera no leste dos Estados Unidos, uma região muito mais urbana e sofisticada. Acabara de se formar em uma prestigiosa escola de design de moda e havia planejado sua própria vida desde seus primeiros passos, ainda na infância. Uma jovem que, num impulso irracional e pouco típico de seu temperamento, decidira ir até o Colorado, para visitar sua tia Mellie, a quem não via havia anos.
   O destino tinha interferido ao interromper seu vôo para Denver, devido a uma tempestade, e ao colocar em seu caminho um cowboy que jamais planejava o próximo passo!
   A meticulosa Abby sempre carregava uma bagagem de mão excessivamente pesada, pois temia que suas malas se extraviassem, um fato quase rotineiro nos vôos internos. Colocava tudo em uma maleta que levava consigo, dentro do avião, pois detestava separar-se de suas peças pessoais, sempre escolhidas a dedo. Entretanto, ela derrubara apenas sua pasta de desenhos, bastante incomoda de segurar, mas importante demais para ser entregue a um carregador do aeroporto.
   Logicamente, um cowboy tinha de aparecer para ajudá-la! Com movimentos inesperadamente graciosos em um homem tão alto e musculoso, ele apanhara a pasta de Abby. Uma mecha muito loira escapava do chapéu Stetson, dando-lhe um ar quase adolescente. Os olhos azuis não exigiam nada, apenas ofereciam, e o sorriso chegava a ser quase ingênuo.
   — Para onde você estava indo? — perguntou ele, ajudando-a a carregar sua bagagem sem nenhum esforço aparente.
   — Bem... eu pretendia me sentar naquelas cadeiras junto da janela.
   Os dois se dirigiram para o outro lado do terminal, vendo a chuva que caía torrencialmente e batia contra os vidros da janela, como se fosse quebrá-la com seu ímpeto.
   — E para onde irá depois que parar esse temporal?
   — Para Denver.
   — Eu também. Um lugar tão próximo e, no entanto, tão distante — brincou ele, citando a frase de uma música famosa.
   — Tem razão — resmungou Abby, contrariada com o imprevisto. — Se pudemos pousar aqui... por que não em Denver?
   — O tempo fica ainda pior sobre as montanhas. — Ele apontou para um bar próximo das cadeiras. — Que tal vermos a chuva de outra janela? Eu estava dormindo quando serviram o jantar no avião.
   — Pois não perdeu nada! Estava horrível.
   — Então vamos comer um bom sanduíche.
   Enquanto esperavam ser servidos, Ted contou a Abby sobre o rodeio que pretendia participar em Denver.
   — Ainda bem que será em uma arena coberta ou a chuva impediria sua realização. Eu pretendo ganhar o prêmio, que é em dinheiro, para trocar a caixa de transmissão de minha caminhonete e assim não precisar depender de ninguém para me locomover.
   — Acho que você tem razão — falou Abby, que prestara atenção apenas no detalhe da chuva. — Deve estar bem pior em Denver.
   Os raios e os trovões aumentavam de intensidade.
   — Será que teremos de passar a noite aqui? — perguntou ela, preocupada.
   — Não, se você tiver um espírito livre e gostar de caminhar. Quer me acompanhar nessa aventura?
   — Ir até Denver... a pé? E debaixo desse temporal?
   — Podemos pedir carona.
   Abby balançou a cabeça, negativamente, como a boa moça que sempre fora.
   — É perigoso pedir carona!
   — Não será se estivermos cuidando um do outro. Com uma moça tão bonita ao meu lado, eu conseguiria uma carona muito mais depressa. E você teria um guarda-costas.
   — O qual seria... você? — perguntou ela, sem disfarçar a desconfiança.
   — Ou eu ou o motorista. Um de nós dois deve ser um homem honrado, concorda?
   — Prefiro aventurar-me com o piloto do avião!
   — Como quiser. — Ele encolheu os ombros, despreocupado. — Mas vou lhe dizer uma coisa... você pode encontrar um piloto em cada esquina, sabia? Cowboys de verdade são muito mais difíceis de achar.
   — Pois parece que eu encontrei um com toda a facilidade.
   — Só porque não estava procurando. Se estivesse, teria me assustado e eu fugiria como uma lebre!
   Depois de algum tempo de conversa, Ted convenceu-a a alugarem um carro e dividirem a despesa. Ele colocou as malas de Abby, sua sacola de lona e sua sela no bagageiro, debaixo da chuva torrencial, e os dois partiram.
   Ted se dirigia para um rodeio.
   Abby acreditava estar indo visitar a tia Mellie.
   O destino preparara uma situação bastante mais complicada... para ambos!
   Já era bem tarde quando Abby fechou a loja e se dirigiu para o pequeno pátio de estacionamento da loja. Jackie fora embora havia duas horas, desapontada com a recusa de Ted em jantar com as duas. No fundo, ela também se decepcionara. Teria sido um encontro exclusivamente de negócios, mas acabaria sabendo como fora a vida dele nos últimos dez anos. Tratava-se apenas de curiosidade, é claro!
   — Você sempre trabalha até tão tarde?
   O som daquela voz a perturbou tanto que Abby perdeu o equilíbrio, e sentiu a mão forte de Ted segurá-la pelo braço, impedindo-a de cair.
   — Você me assustou!
   — Sinto muito. Não era essa minha intenção. Estranhamente, os dois falavam muito baixo, como dois conspiradores em plena noite.
   — Esperei você para pedir desculpa. Acho que fui um tanto rude ao recusar o convite para jantar.
   — Jackie tem boas intenções, mas costuma ser precipitada demais. — Abby tentou não se perturbar tanto com a proximidade de Ted. — Certamente, nem lhe perguntou se já tinha algum outro compromisso.
   — Não perguntou mesmo. — Virando Abby de frente para ele, encarou-a seriamente. — A idéia não foi sua, não é?
   — Bem... Jackie adora se divertir e sempre quer comemorar quando fechamos algum negócio.
   — Você não escreveu aquela carta.
   Abby engoliu em seco. Um silêncio pesado desceu sobre os dois, até que ela, finalmente, negou com um gesto de cabeça.
   — Eu sabia! Não tinha nada que se parecesse com você. Pelo menos, era muito diferente das cartas que imaginei receber...
   — Você também não me escreveu carta alguma — disse ela suavemente, sentindo que os dez anos de separação haviam deixado de existir, e a mágoa continuava ainda muito intensa.
   — Nem me telefonou.
   — Precisava resguardar meu orgulho de cowboy, princesa.
   — Ted sorriu melancolicamente. — Bem, ele continua intacto, mas o resto de mim...
   Sem perceber como, Abby foi conduzida ao longo do pátio. Ted não era autoritário nem impositivo, mas conseguia levá-la para onde queria. Momentos depois, eles estavam sentados em uma lanchonete, que ficava perto da loja.
   Ela teve a impressão de que se repetia o primeiro encontro no aeroporto, mas agora existia uma barreira entre os dois. A mágoa do passado lhes tirava a espontaneidade, mas ambos queriam saber o que acontecera durante o tempo de separação.
   — O que faz agora, Ted? Depois de ter se afastado do circuito dos rodeios?
   — Tomo conta das boiadas e participo de concursos de laço. Não me obrigam a forçar demais a perna.
   — Você se machucou seriamente?
   — Tive de colocar alguns pinos em meu joelho. As vezes, manco um pouco, mas combina com a imagem de um cowboy veterano!
   — Só que acabou com sua carreira.
   — Não antes que eu atingisse meu objetivo. Afastei-me dos rodeios, mas sou um campeão. Saí de cena em plena glória.
   — Uma glória em estilo country?
   — Exatamente. Como sua loja, concorda? Você quer transformar esse estilo rústico de vestir em algo luxuoso... não é essa sua intenção?
   — Sem dúvida.
   Apesar da aparente descontração de Ted, Abby estava preocupada com ele. Um homem que vivia para competir e vencer não podia sentir-se feliz fora das arenas.
   — Estou indo bastante bem - disse ele, como se tivesse lido os pensamentos de Abby. - Descobri que não era invencível e que consigo conviver com essa realidade.
   — Fico contente em saber...
   — Pensou em mim durante esses anos? - Ele hesitou, por uma fração de segando, antes de prosseguir: - Eu pensei muito...
   — Em quê?                                                        
   — Em você. O que estaria fazendo e... com quem andaria.
   Abby sorriu, feliz por ouvir aquelas palavras.
   — Mas não vou perguntar-lhe nada sobre sua vida... porque não é preciso. No momento, você está a meu lado, e isso me diz que não existe ninguém muito importante a sua espera.
   — Intuição masculina?
   — Talvez. Por acaso, estou errado?
   Os dois se fitaram, e Ted foi o primeiro a desviar os olhos.
   — Acho que fui rude novamente. Ainda sou um tanto rústico...
   — Provavelmente, sempre o será, Ted. E seu estilo. Abby riu involuntariamente, deixando transparecer quanto lhe agradava estar na companhia de Ted.
   — Adoro quando você ri - murmurou ele. - Gosto do som e do jeito que seus olhos se iluminam.
   Mas Ted quase se esquecera da sensação que a alegria de Abby provocava nele...
  
  
   CAPÍTULO II
  
   A tarefa predileta de Ted era cavalgar por seus pastos numa manhã de primavera, controlando sua boiada. Desde menino, acompanhara o pai nesse trabalho, contando os bezerros, verificando o estado das vacas e procurando os touros. Enquanto ajudava, prestava uma enorme atenção nas descrições da fazenda que teriam algum dia, no nome, Double B, e nas raças que criariam.
   Esse dia nunca chegara para o velho Lassiter, mas Ted sentia-se feliz em pensar que realizara o sonho de ambos. Não se desviara nem um milímetro das descrições paternas e criara a fazenda dos sonhos de um pai que permanecera igualmente no filho.
   E essa manhã também era perfeita como as de sua infância. Apesar do frio que matara tantos bezerros, a neve se derretera e abençoara a terra. O desafio de todo fazendeiro era aceitar o lado mau e o bom, sem reclamar. Bastava apenas se esforçar mais, continuar lutando, porque não se tratava de um emprego, e sim de um estilo de vida.
   Finalmente, tinha uma terra que lhe pertencia. Valera a pena quebrar tantos ossos, domando cavalos bravios, e agora justificava o fato de procurar uma outra fonte de renda, felizmente temporária. Sem dúvida, era um trabalho ridículo. E seria menos absurdo manter-se em cima de animais que se recusavam a ser montados?
   Além disso, significava a oportunidade de ver Abby novamente.
   Ted se apaixonara à primeira vista. Ela representava a princesa que seu pai descrevera em um dos contos de fadas, narrados minuciosamente, durante as longas cavalgadas ou nas intermináveis noites de inverno. Em todas as histórias, a bela jovem sempre estava muito acima dos outros seres e era preciosa demais para o mundo dos meros mortais.
   Em meio à agitação de um terminal de aeroporto, Abigail Van Patten surgiu como a princesa de seus sonhos. Ela era frágil demais para carregar malas e precisava ser protegida. Normalmente, Ted ajudaria uma mulher em apuros e, tocando a aba do chapéu, logo se despediria. Mas, normalmente, ele não se apaixonava ao primeiro olhar!
   Essa mulher era diferente de todas as outras. Dez anos antes, tivera certeza de que não havia nenhuma igual a ela. Agora, continuava convicto de que Abby sempre seria sua princesa.
   Durante um verão glorioso, tentara conquistá-la com toda a coragem que possuía e então... ele a vira partir, seguindo seu próprio caminho, Ted escondera a mágoa profunda e não sonhara com uma reconciliação. Afinal, como pedir a uma princesa para seguir de rodeio em rodeio, acampando em plena pradaria ou dormindo em motéis baratos?
   O breve romance terminara, como ele sempre previra. Entretanto, os momentos partilhados haviam sido únicos. O verão de sonho jamais se repetiria, mas a lembrança duraria para toda a vida.
   Depois de convencer Abby a acompanhá-lo ao primeiro rodeio, o mundo mudara. Ted vencera, conseguira recuperar sua velha caminhonete, e ela aceitara a promessa de aventura. Concordara em ir para a cidade seguinte, e assim se iniciara o mais glorioso verão da vida dê Ted.
   Os dois viajavam quase sem bagagem, planejando um novo percurso a cada dia. No início, Abby insistira em dormirem nos motéis, à beira da estrada, em quartos separados. Logo, ela reconheceu que ficava caro demais, e passaram várias noites na parte traseira da caminhonete, contando as estrelas.
   Como a princesa dos contos de fadas, Abby não se entregava facilmente. Cada beijo foi uma conquista e cada carícia uma vitória. Ted continha o desejo e se apaixonava mais a cada dia que passava. Iria chegar a noite em que ela seria sua.
   Abby chegou à loja, às sete horas da manhã, como sempre. Ela pretendia separar as roupas que Ted usaria e sair de cena, fechando-se em seu escritório. Mas Jackie não queria assumir toda a responsabilidade e exigiu que ela permanecesse presente. Jackie contratara Gayle Browning para exibir as roupas femininas, e a descontração da modelo experiente pareceu contagiar Ted. Na verdade, o olhar de adoração da jovem o deixava ainda mais bem-humorado... e irritava Abby de uma forma irracional!
   — Eu tenho pavor de cavalos — disse Gayle, revirando os belos olhos verdes. — Mas ele me transmite tanta segurança, que vou até tentar!
   Abby já cavalgara com Ted e sabia que ele transmitia segurança e algo muito mais intenso, quando a envolvia em seus braços fortes.
   Se ela não quisesse perder a cabeça e gritar com aquela garota insinuante, teria de agir como a mulher de negócios que era!
   — O que pretende fazer à tarde, Jackie? Você me sugeriu que usássemos o parque a leste da cidade, mas não é bem o lugar ideal. Poderíamos sair a fim de encontrar um local que combine melhor com a essência de nosso catálogo.
   — Sinto muito, mas não posso ir com você — desculpou-se Jackie. — De qualquer forma, o setor artístico é responsabilidade sua, querida. Sabe que não tenho muito jeito...
   — Pedirei a Tom para me acompanhar —, interrompeu-a Abby, irritada com as desculpas da sócia. — Ele é o fotógrafo e saberá exatamente o que precisamos.
   — Tom também está ocupado — disse Jackie, de costas para Abby, enquanto separava as roupas já experimentadas pelos dois modelos. — Na verdade, sairemos juntos, a fim de encontrar jóias e outros acessórios necessários.
   — Então deixarei para amanhã. Ficarei na loja.
   — Wanda virá à tarde, portanto está livre para ir. Afinal, não saiu desta loja desde que abrimos!
   As insinuações de Jackie finalmente atingiram, o objetivo pretendido. Ted aproximou-se de Abby, com um sorriso descontraído.
   — Talvez eu possa lhe mostrar o lugar ideal para nós. Aceitaria ir comigo só para verificar se gosta?
   — O lugar ideal... para nós? — Ela o fitou, imaginando dezenas de possibilidades fascinantes. Então, caiu em si. — Ah! Está se referindo ao cenário de nosso catálogo?
   — Não era sobre isso que estavam falando? — perguntou Ted, disfarçando a vontade de rir. — Eu moro aqui e conheço todos os arredores.
   — E por acaso também está livre esta tarde, certo? — indagou ela, irritada por ter deixado transparecer suas emoções.
   — Claro! E garanto-lhe que não cobrarei nem um centavo extra!
   Seguindo a sugestão de Ted, Abby trocou a saia e o blazer por calça de linho e tênis. Aquela roupa esportiva trouxe de volta recordações que ela se apressou em sufocar, sem muito êxito.
   Ele saiu da cidade e seguiu uma estrada de terra tortuosa que os levou até as margens do lago Sylvan. Os dois caminharam pela orla de granito por algum tempo, em silêncio, admirando a vida selvagem da região.
   Finalmente, Ted parou, sentando-se sobre uma rocha bem junto da água.
   — Nós não passamos por South Dakota naquele verão — falou Abby, pensativa. — Por que nunca me trouxe até este Estado?
   — Não estava em meus planos — resmungou ele, abaixando a aba do chapéu para proteger-se do sol.
   — Mas era seu lar! Tinha família aqui e não custaria fazer um pequeno desvio.
   — Eu considerava este local como uma espécie de base e não de lar. Pelo menos, não como o que a maioria das pessoas chama de lar.
   — E agora tem um... como a maioria das pessoas considera?
   — Claro! — Ele riu, olhando para uma águia que voava em círculos sobre o lago. — Tenho um lugar para guardar minha caminhonete.
   — E para guardar seu cavalo, certo?
   — Algo que você ainda não conseguiu.
   — Acertou. — Ela sorriu, forçando-se a ser objetiva. — E um lugar bonito, mas será que carros normais passam por essa estrada?
   — Podemos deixar o carro e fazer a última etapa a cavalo.
   — Gayle tem medo de cavalos.
   — Mas você não tem, certo? Poderíamos ir na frente, e o resto do grupo seguiria pela outra estrada. Então nos encontraríamos aqui.
   — Precisaríamos acordar muito cedo. Tom prefere fotografar com a luz da manhã.
   — Ou quem sabe viríamos na noite anterior e acamparíamos ao ar livre. Lembra-se do rodeio de Cheyenne?
   — Claro que me lembro!
   A atitude de Abby era de defesa, a fim de se sobrepor ao tom sensual de Ted. A voz dele relembrava momentos de intimidade de uma noite inesquecível. Uma noite que parecia ter precedido aquele dia e não ocorrido havia dez anos.
   Ela jamais esqueceria a primeira noite em que se entregara a Ted. Depois de cavalgarem por campos cobertos por flores silvestres, ele emprestara uma barraca de um amigo e a erguera às margens de um riacho. Como não lembrar da paixão de ser amada em plena natureza por um homem que a levara ao delírio?
   Então, ela afastou essas lembranças que ainda a faziam sofrer e o encarou, com firmeza.
   — Por que aceitou esse emprego, Ted?
   Ele permaneceu em silêncio durante algum tempo. Jamais confessaria que havia aceitado porque ela o chamara.
   — Achei que era um bom dinheiro para ficar algumas horas usando roupas bonitas. Estou precisando melhorar minhas finanças.
   — Eu não costumo acampar — murmurou Abby. — Só o fiz naquela noite e depois... no Wyoming.
   — Eu entendo. Você prefere hotéis de luxo, com serviço de quarto, certo?
   — Não necessariamente. — Ela deu um sorriso provocante. — Mas um restaurante por perto, e com uma bela vista, sempre ajuda!
   — E existe uma vista mais bonita do que esta? — Ted aproximou-se mais de Abby, mesmo prevendo que seria rejeitado. — E atualmente cozinho bem melhor do que dez anos atrás!
   — Nós queríamos algo mais rústico, como uma fazenda, para nosso catálogo — prosseguiu Abby, como se realmente estivessem discutindo negócios. — Por acaso não conhece nenhum fazendeiro disposto a nos permitir fotografar algum canto de sua propriedade?
   — Talvez eu conheça...
   — Pagaríamos a taxa habitual para uso de propriedades particulares. Quem sabe essa proposta possa interessar ao homem para quem você trabalha?
   — Homem para quem trabalho?
   — Não disse que estava conduzindo boiadas?
   — Oh, sim! — Ele riu, divertindo-se com a situação. — Mas por que acha que trabalho para um homem?
   — Desculpe-me, eu tiro sempre conclusões apressadas. Mas você tem esse mesmo defeito, sabe? Não sou mais a garota que perdeu a cabeça diante de seu encanto rústico. Não vou passar a noite em seus braços em uma barraca, nem na traseira de sua caminhonete ou no apartamento de seu amigo...
   Abby ergueu os olhos para o céu, procurando a jovem que deixara de existir e só encontrou a mulher em que se transformara.
   — Tive sorte em recuperar o bom senso... em tempo.
   — Então, foram cinco semanas de sofrimento para você?
   — Não... — ela hesitou, escolhendo as palavras certas para se exprimir — foi uma lição muito dura.
   — E o que você aprendeu? A ir embora antes de sofrer mais?
   — Quem realmente foi embora, Ted?
   Suspirando, Abby reviu a cena da despedida em uma estação de ônibus de um vilarejo do Texas, como se a visão flutuasse sobre o lago, com toda a nitidez. Eles a viam de forma diferente e tinham sentimentos diversos, mas a enxergavam juntos.
   — Nós dois partimos ao mesmo tempo, Ted. O fim teria de chegar algum dia, e seguimos nossos caminhos que eram opostos.
   — Eu lhe pedi para me conceder um pouco de tempo, Abby. Ficar comigo, sem exigir nada de imediato, mas até eu poder...
   Ted a encarou, ansioso por transmitir uma emoção que não colocaria em palavras. Abby não desviou os olhos, sabendo que ele iria se repetir e soar apenas um eco do passado.
   — ... Até eu me tornar alguém a sua altura.
   — Ficar comigo... O que significam exatamente essas palavras, Ted? Até hoje, continuo sem compreender.
   Ele não tinha como explicar e só lhe restava tomá-la nos braços para demonstrar e calar seu protesto com um beijo que servisse de resposta.
   Mas Ted esquecera o doce sabor dos lábios de Abby e a suavidade generosa do corpo que se colava ao seu. Nunca pensara no significado real de seu pedido, mas agora sabia que a queria para sempre em seus braços.
   Subitamente, tinha a sensação de ter voltado ao lar, recuperando o paraíso perdido fazia tanto tempo. Haviam se passado tantos anos de intensa solidão que o toque de seus lábios parecia transformar o mundo novamente em um lugar de felicidade e paz.
   — Eu quero você sempre a meu lado... não importa onde eu esteja.
   — Não posso! — exclamou ela, soltando-se dos braços de Ted, Ele se sentiu envolvido por uma tristeza profunda.
   — Quero dizer... não podia. Eu não conseguia viver daquela forma, Ted.
   — Eu sei. Você tinha seus próprios sonhos.
   — E nossos sonhos não combinavam, certo?
   — Acho que não. — Ele se surpreendeu com a tristeza refletida nos olhos de Abby. — Mas todo o resto combinava com perfeição!
   Abby fechou os olhos e murmurou o nome dele, como se fosse um apelo e não uma rejeição.
   — Você me amou... naquele verão.
   — Eu pensei que tinha amado.
   — Pensou! — Ele tocou os sedosos cabelos de Abby. — Não é a palavra certa, querida. Se fosse assim, você jamais teria dormido comigo num valo à beira da estrada.
   — Se eu tivesse ficado com você... acho que o teria amado de verdade.
   Ted afastou-se, insatisfeito. Queria que Abby admitisse tê-lo amado no passado. Não aceitaria que ela simplesmente se submetera a uma paixão momentânea.
   — E pensou que eu não queria algo mais duradouro para nós, Abby?
   — Não pensei que você tivesse planos a nosso respeito, Ted. Achei que sua única preocupação na vida era com o próximo rodeio do qual participaria.
   — Enquanto isso, sua mente trabalhava o tempo todo — zombou ele. — Pensando que havia me amado, certo? Pois eu tenho certeza! Você me amou mesmo. Olhe para mim e negue, se for corajosa. Na verdade, sente medo de admitir porque sabe quanto me amou. Se não fosse assim, jamais ficaria a meu lado, nem por cinco semanas.
   — É verdade — murmurou ela, desviando o olhar.
   — O que é verdade? — insistiu Ted.
   — Eu te amei muito. Apaixonei-me demais e foi tudo muito rápido, a ponto de me apavorar. Eram emoções tão intensas que... não me restava tempo para pensar.
   — Ah! Então, você começou apensar depois de nos separarmos?
   — Acho que sim...
   Ted voltou a colocar as mãos sobre os ombros de Abby, tocando-lhe a pele macia dos braços.
   — Acho que meu interesse em criar roupas no estilo country não foi uma coincidência. Eu admito que não foi.
   — Mas você nunca me viu usando roupas tão elegantes quanto as que criou — disse ele, rindo.
   — Não gostou de nenhuma?
   — São caras demais para um homem que trabalha para se sustentar.
   — Como já lhe disse, você ficará com todas que apresentar. Queremos que as pessoas o vejam usando nossas criações.
   — É um bônus muito generoso.
   — E o único que receberá.
   Ele a fitou, escondendo a sensação de vitória que o envolvera. Na verdade, conseguira o único bônus que poderia desejar, ao beijá-la e ser correspondido com idêntica paixão. Com um gesto casual, segurou-lhe a mão e não a soltou, enquanto caminhavam pela beira do lago.
   — Então, não está mesmo interessada em acampar em plena natureza?
   — Desista, cowboy!
   — Mas você me amou e ainda gosta de meu estilo.
   — Eu ainda adoro seu estilo, Ted! Afinal, investi todo meu dinheiro nele.
   — E parece que deu certo! Agora... quer mesmo conhecer o lugar onde eu trabalho? Encontrar meu patrão?
   — Acha que o lugar irá suprir nossas necessidades?
   — Bem... ele supre as minhas. Quanto as suas, terá de ver pessoalmente e decidir por conta própria.
  
  
   CAPÍTULO III
  
   Uma placa de madeira ostentava o nome da fazenda, Double B, sobre a porteira, além da qual começava a pequena estrada de terra que levava à sede. O caminho, recoberto de cascalho, cruzava um campo muito verde e salpicado de flores silvestres amarelas e brancas. Os currais e o celeiro eram entrevistos por detrás da casa, e, mais além, enormes pinheiros cobriam as encostas das colinas, como um majestoso pano de fundo.
   — Que lugar lindo! — exclamou Abby, ao descer da caminhonete, que Ted estacionara ao lado de um pequeno carro branco... — Onde você fica? No alojamento dos peões, com o resto da turma de trabalho?
   — Eu fico na casa. Afinal, eu sou a turma de trabalho. Segurando o braço de Abby, ele subiu os degraus que levavam à varanda e entrou no vestíbulo, onde deixou o chapéu. Então, conduziu-a para dentro de uma cozinha clara, com móveis de pinho e enormes janelas, que deixavam entrar o sol e a beleza da paisagem campestre.
   — Kate? Você está em casa?
   Abby ouviu o som das botas de Ted sobre o assoalho, que devia ser de tábuas largas, afastando-se da cozinha para o interior da casa.
   — Ei, Kate! Há alguém aqui que quer conhecer você! Está vestida decentemente?
   Subitamente, a porta lateral se abriu, e uma senhora robusta e de cabelos grisalhos entrou na cozinha, secando as mãos em uma toalha.
   — Claro que estou vestida decentemente, rapaz! O dia já começou há muito tempo! — Então, ela notou Abby, e um sorriso transformou seu rosto severo. — Ora, ora, quem diria! Ele trouxe uma amiga!
   Ted reapareceu à porta da cozinha.
   — Eu fui cuidar do jardim e... — Kate terminava de secar as mãos — ... estou com as unhas cheias de terra. Você podia ter me avisado, Ted.
   — Onde está seu chapéu? — perguntou ele, preocupado. — Saiu de novo com a cabeça descoberta debaixo desse sol forte?
   — Saí de casa com ele, mas devo tê-lo deixado em algum canto. — O rosto enrugado de Kate indicava que o sol já marcara definitivamente sua pele clara, e era evidente que ela havia passado a maior parte de seus dias ao ar livre, sem se preocupar com cuidados de beleza.
   — Bem... esta mulher teimosa é minha tia Kate. Ela é a patroa por aqui — disse Ted, colocando a mão sobre o ombro da velha senhora. — E esta é Abigail Van Patten, tia Kate.
   — Abigail... — Kate repetiu o nome lentamente, até se dar conta de quem era a jovem. Então, fitou o sobrinho com um olhar de surpresa. — É essa a...
   — Ela é a dona da nova loja de roupas country, a criadora da coleção e quem me contratou para ser seu modelo. — Ele riu, zombando de si mesmo nessa posição que considerava ridícula para um homem rude como ele. — Não sei se mencionei, mas... eu e Abby somos velhos amigos.
   Kate disfarçou a surpresa e a vontade de rir. Ted mencionara algumas vezes aquela jovem, porém fora o bastante para que ela descobrisse quanto Abby era importante na vida do sobrinho.
   — É um prazer conhecê-la, Abigail.
   — Nós estávamos pensando em tirar algumas fotos para o catálogo de Abby aqui dentro de casa... se você não se importar, é claro.
   — E por que eu me importaria?
   — Kate gosta de ter a casa bonita quando recebe alguém. — Ted apertou com mais força o ombro da tia.
   — Eu entendo — disse Abby. — Se alguém quisesse invadir minha casa, pondo tudo em desordem e atrapalhando minha rotina... Entretanto, costumamos pagar pelo uso de qualquer propriedade particular.
   — Que absurdo! — exclamou Kate. — Você já está pagando: Ted para apresentar suas roupas.
   — Não se preocupe com isso, pois é uma prática estabelecida. Kate parou junto da janela, acima da moderna pia de aço inoxidável.
   — O velho celeiro parece o cenário perfeito — Abby acrescentou, olhando através da janela.
   — Bem... — Tia e sobrinho se entreolharam. Kate parecia confusa, e Ted a fitava como se quisesse lhe transmitir uma mensagem urgente. — Ele está trabalhando duro para renovar o celeiro. Aliás, vem se matando para deixar esta fazenda num bom estado!
   — Estou só fazendo meu trabalho. Quanto a um pagamento pelo uso da fazenda para fotos, só você pode decidir se aceita ou não, Kate.
   — Você endoidou, rapaz?
   — Achei que ia aceitar. Afinal, negócios são negócios.
   — É... você endoidou mesmo! — Kate balançou a cabeça, inconformada. — Por mim, vocês podem fotografar o que bem entenderem, tudo mesmo, menos eu! Mas acho que ficou louco varrido, Ted!
   — Este é um exemplo da hospitalidade do Oeste, Abby.
   — Ted riu, divertindo-se com a reação da tia. — Fique à vontade para tirar as fotos que quiser na fazenda... e sem pagar um centavo.
   — Mas o peão da fazenda é um assunto diferente, certo? — brincou Abby.
   — Completamente diferente. Ele custa caro porque é um artigo raro.
   Ted ouviu o resmungo da tia, que estava procurando algo na geladeira.
   — Preciso de um favor seu, Kate. Pensei em selar dois cavalos e levar Abby para conhecer o resto da fazenda. Pode nos preparar um lanche?
   — Mas... não estou vestida para andar a cavalo, Ted!
   — Isso nunca foi um problema para você antes. Ei, Kate? Tem alguma calça jeans para emprestar a Abby?
   — Se ela não se importar em usar calça larga... Fechando a geladeira, Kate começou a preparar o lanche.
   — Que tal um piquenique campestre, srta. Abigail? — O olhar de Ted era decididamente malicioso, — Quem sabe encontraremos um valo perto da estrada...
   — Ted! O que você tem hoje? — Kate bateu a cesta de piquenique sobre a mesa. — Desculpe, moça. Ele costuma ser muito bem-educado.
   — É só brincadeira, Kate. Abby é uma garota da cidade grande, e adoro provocar essas moças que nunca viram capim alto na vida!
   — Mas trate de comportar-se, ouviu! — Kate agitou a colher de pau diante do rosto de Abby. — Se ele a maltratar, quero que me conte tudo, moça. Eu ajudei a criá-lo e ainda posso colocá-lo na linha!
   Meia hora depois, os dois se afastavam da casa, e Ted não escondia a ansiedade de mostrar a Abby as pastagens aveludadas no fundo dos vales entre as colinas cobertas de pinheiros.
   Sua fazenda! Mais cedo ou mais tarde, teria de lhe contar a verdade, mas só depois que Abby desse uma opinião a respeito da propriedade. Não se sentia pronto para revelar que estava expondo uma parte muito íntima de si mesmo ao levá-la nessa excursão por suas terras. Agora a Double B era toda sua vida!
   Eles partilharam o piquenique, preparado por Kate, junto de um riacho cristalino, à sombra de altos pinheiros. Tão logo o sol começou a se pôr, uma brisa fresca da montanha se fez sentir, e Ted colocou sua jaqueta de brim sobre os ombros de Abby, tocando-a por mais tempo do que seria necessário.
   — O que você contou a sua tia, Ted? Disse-lhe que fomos amantes?
   — Esse é um assunto que só interessa a nós dois, Abby.
   — Mas ela sabia alguma coisa a meu respeito.
   — Claro. Mostrei-lhe a carta que você escreveu... ou melhor, que Jackie redigiu. Só disse a ela que a mulher mais linda do mundo estava disposta a me pagar para usar as roupas de sua loja.
   — Sua tia tem razão. Você é mesmo incorrigível. Afinal, está trabalhando para ela, ou tomando conta dela?
   — Nós tomamos conta um do outro, creio eu... Kate perdeu o marido há menos de um ano. Carl estava trabalhando no campo e foi atingido por um raio.
   — Oh, que horror!
   — Não sei... Carl morreu imediatamente, sem sofrer, em suas terras e no fim de um produtivo dia de trabalho. Estava com setenta e oito anos, era muito ativo e não sentia nada, além de uma ligeira dor nas juntas, quando ficava muito frio. Mas Kate...
   Ted calou-se, lembrando as lágrimas da tia, enquanto revia velhas fotografias do marido.
   — Ela sente muita falta de Carl. Essa é a pior parte. Ficar só quando o outro se vai...
   — Você nunca me falou sobre sua família — murmurou Abby, tocando-lhe o braço suavemente.
   — Não há muito para contar. Carl e Kate estavam casados havia cinqüenta anos quando ele morreu. Viveram sempre na mesma casa e nunca tiveram filhos.
   — Mas ela ajudou a criar você, certo?
   — Ocasionalmente, eu ficava na casa deles, quando era criança. Kate é a irmã mais velha de meu pai.
   — Contou-me que seu pai morreu quando você estava terminando o ginásio. E sua mãe?
   — Não me lembro muito dela — respondeu Ted, contrariado.
   — E seus pais? Ainda moram no Leste?
   — Os dois se aposentaram, venderam a casa e se mudaram para a Flórida. — Abby percebera a reticência de Ted, mas pretendia insistir no assunto. — Sua mãe...
   — Não sei! — Ele desviou o olhar. — Não há nada para contar, Abby. Lembro-me muito pouco dela.
   — Desculpe. Eu não tinha intenções de me intrometer...
   — Tudo bem. Não se preocupe com isso.
   Abby decidiu não tocar mais naquele assunto e olhou para o céu, onde começavam a surgir as primeiras estrelas. O único som era o da brisa entre os pinheiros e o murmurar suave do riacho.
   — E muito lindo este lugar!
   — Acha mesmo? — Ted sentiu uma alegria intensa.
   — Eu me apaixonei pelo Oeste há dez anos. Não queria ir embora e... arrumei um emprego em Denver. Vejo as montanhas da janela de minha sala.
   — E quando pretende voltar para casa?
   — Quando terminar o catálogo da loja. — Ela o fitou, curiosa. — E você? Quanto tempo ainda vai ficar por aqui?
   A pergunta o pegou de surpresa.
   — Ficar aqui, trabalhando para sua tia — explicou ela. — A grama já está crescendo debaixo de suas botas, cowboy!
   — Então, é melhor tirá-las. Que acha de mergulharmos os pés nessa água fresca?
   A proximidade de Ted transtornava Abby, e, sem que ela percebesse, foi envolvida pelos braços fortes. Subitamente, sentia-se de volta ao passado, e seus lábios se entreabriram à espera do beijo.
   Naquele momento, Abby perdeu a capacidade de pensar em quanto sofreria depois e se entregou ao prazer de sentir as mãos de Ted deslizarem por seu corpo. Ela voltava a ser a garota ingênua, apaixonada por um cowboy viril, que a envolvia com uma magia irresistível.
   O primeiro sei para fotografias foi montado junto do celeiro. Na opinião de Abby, o cenário era ideal e a situação seria perfeita se Tom, o fotógrafo, não insistisse em um realismo absurdo no relacionamento entre os dois modelos.
   Ele queria que ambos deixassem bem clara uma atração intensa, agindo como se estivessem realmente apaixonados.
   — Sorria para ele! — repetia Tom. — Dê a impressão de que também quer beijá-lo, mas pretende torturá-lo até entregar seus lábios. Isso! Ótimo!
   Abby ouvia o clicar da máquina fotográfica e mal continha a irritação. Ted e Gayle formavam um casal lindo e essa fora a sua intenção ao contratá-los. Por que essa raiva irracional sempre que os dois se tocavam com mais intimidade?
   Na verdade, ela e Ted tinham passado da conta na noite anterior, ambos embriagados pelo luar e pela brisa das montanhas. Por isso, sentia-se enfurecida ao ver outra mulher tocá-lo!
   Era uma típica ressaca. O encanto daquele cowboy era reconhecidamente embriagador, e Gayle estava apresentando os sintomas de quem bebeu demais. Abby queria alertá-la a tomar apenas alguns goles ou acabaria se viciando naquela doçura máscula. Ted conquistava sem esforço, mas estava sempre em movimento, deixando um lugar em busca de outro melhor.
   Quando Tom sugeriu que Gayle tocasse o peito de Ted, Abby decidiu se retirar do local. Mas antes teria de entregar a prancheta de trabalho a Jackie, e a sócia não estava por perto.
   — Assim está bom? — perguntou Gayle, deslizando os dedos pelo peito de Ted, enquanto o fitava com um olhar de tórrida paixão.
   Fazendo parte do cenário, o cavalo de Ted relinchou.
   — Nosso propósito é montar um catálogo de moda, não uma novela romântica — resmungou Abby. — Até o cavalo está perdendo a paciência!
   Naquele instante, Jackie retornou ao set, e, depois de lhe entregar a prancheta com a seqüência das fotos, Abby dirigiu-se para o carro.
   — Ei, chefe!
   Ela ouviu a voz de Ted as suas costas e o som de seus passos se aproximando.                                                     
   — Antes de ir embora, é melhor me dizer o que ainda falta para ser feito hoje.
   Ted apoiou o braço sobre a capota do carro, parado junto da barraca onde ficavam as roupas a serem usadas nas fotos.
   — Nunca tive uma mulher para me dizer o que devo vestir. Sempre senti curiosidade de saber como seria...
   — Certamente não combina com seu estilo!
   — Por que não? Os homens não sabem combinar as roupas. E, se quer saber mesmo o que não combina com meu estilo... é Gayle!
   — Pobrezinho! — exclamou Abby, percebendo que ele apenas queria deixá-la mais receptiva. — Bem, aqui está a lista das próximas fotos...
   — Abby? — Ted colocou as mãos sobre os ombros dela. — Qual é o problema?
   — Não há problema algum.
   — Passei dos limites ontem à noite?
   — Não. Quem se excedeu fui eu!
   — Mas nós apenas nos beijamos.
   Ted fizera uma fogueira, e os dois permaneceram abraçados, admirando as chamas. Conversaram e se beijaram, até que ambos não continham mais o desejo de intensificar as carícias. Carícias mais ousadas, delirantes e repletas de falsas promessas.
   — Acho que a surpresa foi mútua, concorda? — Ted moveu as mãos sobre os ombros de Abby. — Continuamos a sentir o mesmo prazer da primeira vez e não esperávamos...
   — Eu me surpreendia com mais facilidade naquela época.
   — Não se trata disso, Abby. O que acontece entre nós é natural, brota de dentro de nossos corpos. Sem fingimentos ou pretensões.
   — Tem razão. — Ela não queria prolongar aquele assunto. — Apenas aconteceu.
   — E a surpresa foi sentir o mesmo prazer, sabia? Beijos perfeitos...
   — Mas como você é modesto! Faz parte de seu estilo country?
   — Aposto que você também se surpreendeu.
   — De maneira nenhuma. Beijar é meu passatempo favorito. Só sinto não ter mais tempo para me dedicar a ele...
   Ted a calou com um beijo e, quando a soltou de seus braços, sorria por ter sentido o gosto da verdade nos lábios de Abby.
   — Vamos encontrar tempo... pelo menos enquanto você estiver por aqui.
   — Nós dois temos de trabalhar, cowboy! Eu quero as fotos, e Kate merece receber algum esforço seu pelo dinheiro que lhe paga.
   — Céus! As mulheres são verdadeiras feitoras de escravos! Abby separou uma das camisas mais finas e a entregou a ele.
   — Esta será usada na próxima foto.
   — É muito bonita. — Ele começou a tirar a camisa que vestia, e Abby desviou o olhar. — Acha elegante o bastante para sair comigo?
   Ela o fitou, sem compreender a pergunta.
   — Se não se importa em sair com um peão, eu preciso de uma companhia para o rodeio do dia quatro de julho. Nesta região, é o acontecimento mais importante do que a festa de Ano-Novo. Seria vergonhoso comparecer sozinho.
   — E não acha vergonhoso sair com a mulher que o contratou para trabalhar?
   — Sei que todos vão zombar de mim, mas... eu sempre tive mais coragem do que bom senso.
   — Pois esse problema só acontece comigo quando você está por perto.
   — Deve ser contagioso! — A voz de Ted era acariciante. — Reserve seu tempo para mim, enquanto estiver aqui, Abby;
   — Está bem...
   — Então, irá comigo ao rodeio? — perguntou ele, sem acreditar no que ouvira.
   Abby sorriu, esquecendo-se da prudência. Afinal, que mal haveria em ir a um único rodeio com Ted?
   — Está combinado. Vamos juntos!
  
  
   CAPÍTULO IV
  
   Nas cinco semanas inesquecíveis que vivera ao lado de Ted, Abby considerara o rodeio como uma rival, mas sempre escondera seu ciúme. Haviam se passado dez anos, ela amadurecera e agora estava convicta de que seria apenas um acontecimento regional, igual a todos os outros.
   Mas não era verdade. Quando Ted lhe revelou que também participaria, Abby descobriu que aquele rodeio seria ainda mais emocionante e muito mais perigoso.
   Quando o mestre de cerimônias anunciou que o veterano campeão iria se apresentar, a platéia delirou. Ted Lassiter representava aquela região havia anos e se tornara um herói depois de ganhar o título. Abby sentiu que seu coração disparava, batendo em conjunto com os dos milhares de espectadores emocionados.
   A apresentação de Ted foi o sucesso esperado, e então veio a segunda surpresa que ele lhe reservara. Em vez de assistir à exibição dos fogos de artifício na arquibancada de honra junto com os outros cowboys, convidou-a a vê-los de um lugar especial, no alto de uma colina a leste da cidade.
   No fundo, Abby sabia que, ao aceitar o convite, estaria se arriscando a perder a coragem e a não resistir ao fascínio de Ted. Mesmo assim, concordou em ir ao recanto agreste que ele escolhera e se encantou com a clareira entre os pinheiros, forrada por uma relva aveludada.
   Ao longe, viam-se as luzes multicoloridas do parque onde se realizava o rodeio e as mais uniformes da cidade distante. No alto da colina, havia apenas a escuridão da noite e o brilho manso das estrelas. Temendo ceder muito facilmente, Abbi tentou levar Ted a falar de si próprio.                               
   — Uma vez, eu vi um filme em que um casal de namorados vinha para o alto de uma colina para assistir ao espetáculo dos fogos de quatro de julho — disse ele, sorrindo maliciosamente. — Pois não viram nada porque ficaram se beijando tempo todo!
   — Você ia muito ao cinema? — perguntou Abby, ignorando a insinuação de Ted.
   — Bastante. Meu pai costumava me levar a um cinema drive-in, mas eu nunca dormia como as outras crianças. Adorava cinema! Ele fechava os olhos quase imediatamente. Nunca soube se estava acordado ou fingindo dormir. Meu pai era...
   Os fogos de artifício começaram a brilhar no céu, e, por alguns instantes, os dois se maravilharam com a cascata de pingos dourados que parecia iluminar todas as colinas.
   — Seu pai era...? — insistiu ela, no intervalo entre uma explosão de luzes e a outra.
   — Ele era um cowboy. Só ocasionalmente ele participava de rodeios, mas montava qualquer animal de quatro patas e laçava tudo que se movesse. Essas atividades representavam seu prazer e seu trabalho.
   — Ele tinha a própria fazenda?
   — Não. Sempre foi contratado pelos donos das terras. Quando o proprietário não objetava e havia lugar sobrando no alojamento, meu pai me levava com ele. Caso contrário, eu ficava na casa de tia Kate.
   — Então sempre foi uma espécie de cigano.
   — De uma certa forma, fui mesmo. Passei por muitas escolas, mas consegui o diploma. — Suspirando, Ted colocou o braço sobre os ombros de Abby. — Nós dois sempre sonhamos em ter um lar, terras que fossem nossas para cuidar. Então encaramos a realidade. Só iríamos criar mais problemas, e talvez alguns, como contabilidade e preços de mercado, fossem difíceis de superar.
   Novamente, o céu se iluminou, dessa vez com uma cascata prateada, e os dois se calaram. Agora estavam muito próximos, e Abby sentiu que seu corpo se amoldava ao de Ted, como se tivessem sido feitos para permanecer colados.
   — Eu quero fazer amor com você... esta noite, Abby.
   — Eu sei. Ou melhor, eu já sabia quando aceitei seu convite.
   — Desde que a vi na loja, esperava por este instante. Às vezes, eu me esqueço da realidade e acho que posso voltar ao passado e reviver aqueles momentos...
   Com uma gentileza inesperada em um cowboy com mãos calejadas, ele abriu os botões da blusa de Abby. Seus dedos deslizaram pelo decote rendado do sutiã, tocando a rigidez dos seios.
   Ela arqueou o corpo, suspirando de prazer. Jamais esquecera a primeira vez que Ted a despira e se maravilhara com a forma perfeita de seus seios. Então, sentiu a brisa fresca da noite tocar sua pele e os lábios ávidos se apossarem de um mamilo. Seu suspiro se transformou em um gemido de volúpia.
   — Continue vendo os fogos — murmurou ele, deitando-a sobre a relva macia.
   Mas nenhum dos dois tinha forças para conter um desejo que crescia desde o reencontro. Subitamente, pareciam ter se transformado em adolescentes que descobrem o sexo. Ávidos e ansiosos, afastavam as roupas que impediam seus corpos de se tocarem plenamente e procuravam dar e receber prazer.
   As sensações se tornavam cada vez mais intensas, e Abby voltou a sentir-se a jovem que acreditava ser a mulher mais amada em todo o inundo. Ted a completava, e seus corpos se fundiam, transformando-se em um só. Suas vozes também se uniam, para celebrar o prazer do êxtase.
   Quando a paixão foi saciada, Abby ainda precisava do aconchego daqueles braços fortes, do conforto da voz que murmurava palavras de ternura em seu ouvido e do calor do corpo que protegia sua fragilidade feminina. Ted a transformava em uma mulher sensual, ávida de volúpia e disposta a demonstrar seu amor de todas as formas possíveis.
   O sonho sempre acaba, mas, naquele momento, bastava-lhe estar nos braços do homem que nunca deixara de amar, sentindo a brisa da noite tocar seus corpos nus e iluminados apenas pelas estrelas.
   No dia marcado por Jackie para as fotos nos pastos mais distantes, Abby decidiu ficar na sede e visitar Kate. A velha senhora não disfarçou sua felicidade com aquela delicadeza e arrumou uma mesa para o chá que mais parecia a de um banquete.
   — Eu realmente vim porque precisava lhe pedir um favor.
   — Abby não teve coragem de recusar o chá. — Precisamos de algumas fotos de interiores, e o ideal seria uma sala de verdade e não uma montagem. A sua é perfeita e...
   — Já falou sobre esse assunto com Ted? — perguntou Kate, insistindo para que Abby aceitasse mais um pão de mel.
   — Não, achei que devia me dirigir diretamente a você. E gostaria de convencê-la a receber a taxa habitual...
   — Gostou mesmo desta sala? — interrompeu-a Kate, ignorando as últimas palavras de Abby.
   — É muito aconchegante. As poltronas são amplas, e toda a decoração sugere calor e conforto. Parece nos convidar a procurar refúgio dentro dela.
   — Como o abraço de um homem? — Kate esperou um instante, até que Abby entendesse a comparação. — O de Ted, talvez?
   — A sala tem mesmo um toque masculino — falou Abby, sem responder à pergunta de Kate. — Ted contou-me sobre seu marido. Não consigo imaginar a tristeza de perder um homem, depois de viver cinqüenta anos junto dele. Deve ser...
   — Não é assim, querida. Eu não consigo imaginar a tristeza que seria passar todos esses anos sem ele. Graças a Deus, não precisei viver sem Carl.
   Emocionada, Abby levantou-se da mesa, a fim de examinar os enfeites da sala. Havia peças de arte típicas do Oeste, um rifle antigo, várias estantes de livros e... nenhuma fotografia da família. Talvez as lembranças ainda doessem muito no coração de Kate.
   — Quantos anos têm esta casa? Não me parece tão antiga...
   — Abby encolheu os ombros, deixando de lado aquela idéia absurda. — Mas você e Carl sempre viveram aqui, não é?
   Kate deu uma gargalhada.
   — Acha mesmo que esta casa parece ter cinqüenta anos de vida e lembranças em comum?
   Intrigada com a resposta de Kate, Abby aproximou-se da sela com incrustações de prata.
   — Era de seu marido?
   — Não. Pertence a Ted.
   — Oh... — A peça era de coleção, e Ted nunca seria um colecionador. Talvez a tivesse ganhado como prêmio em algum rodeio. — E o rifle?
   — Também é de Ted.
   O olhar de Kate era tão estranho que Abby começava a se sentir desconfortável.
   — Será que está começando a enxergar, moça?
   — Claro — deduziu Abby. — Ted é mais um filho do que um sobrinho, certo?
   Kate suspirou, desanimada. Então, sorriu com as lembranças que lhe vinham à mente.
   — Billy era meu irmão caçula, quase um filho para mim, e Ted se parece muito com o pai. É orgulhoso, de uma teimosia irritante, mas tem a cabeça repleta de sonhos. — Kate puxou Abby para a mesa novamente e a fitou com olhos brilhantes de emoção. — Um romântico inveterado, como todos os cowboys.
   — Eu sei... são encantadores e completamente livres.
   — Também têm corações moles demais! Quando se apaixonam... — Kate desviou o olhar para a janela e, respirando fundo, voltou a encarar Abby, que se sentara a sua frente. — Ted lhe falou sobre a mãe?
   — Só me disse que sabe muito pouco a respeito dela.
   — Apenas ficou sabendo o que o pai lhe contou. Ted é sensato o bastante para se dar conta do romantismo paterno. Billy encontrou o único amor de sua vida quando estava em um hospital, com a perna quebrada por uma vaca brava. Ela se chamava Charlotte. A mãe de Ted, não a vaca!
   — É evidente! — Abby não conteve o riso.
   — Ora, srta. Abigail! Não é que você até consegue entender quando se esforça um pouco? — brincou Kate, também rindo. — De qualquer forma, Charlotte surgiu como um anjo na vida de meu irmão.
   — Ela era enfermeira?
   — Não, devia ser uma espécie de voluntária porque freqüentava a universidade... vinha de um mundo muito diferente. Mas Billy sempre foi um homem bonito demais, desses tipos que atraem as mulheres como moscas. Bem, você pode imaginar só olhando para Ted, concorda? Além disso, era um cowboy autêntico, e eles têm um encanto irresistível.
   — Posso imaginar bem demais.
   — Então, vou lhe contar que desgraça foi toda essa beleza romântica! — Kate inclinou-se para a frente, aproximando-se mais de Abby. — Meu irmão amou essa mulher até o último dia de sua vida, e ninguém jamais ousou criticá-la por ter abandonado marido e filho, pelo menos na frente dele! Charlotte era a princesa de Billy e merecia um castelo.
   — P-princesa? — gaguejou Abby, chocada.
   — É como Billy se referia a ela.
   — E Charlotte abandonou também Ted?
   — Deixou os dois. Billy e Charlotte não eram casados, e, quando ela engravidou, não queria ter filho algum. Billy desejava ser pai mais do que tudo no mundo.
   Kate serviu-se de chá com gestos tão bruscos que derrubou parte do líquido sobre a toalha branca.
   — Se quer mesmo saber, acho uma atitude anormal! Uma mãe não vai embora, largando o filho que acabou de nascer! Mas Billy nunca perguntou minha opinião, e fiquei de boca fechada. Só estou lhe contando porque... você me parece o tipo de mulher que se interessaria por essa história. Talvez capaz de levar isso em conta e tentar compreender.
   — Não é nada fácil compreender um cowboy, Kate.
   — Sei disso. São muito fechados, guardam todas as emoções no fundo do coração, mas elas são fortes e duradouras. É preciso reconhecer que estão lá dentro e senti-las por ele e para ele. Percebi que você gosta de Ted.
   — Para onde... pensa que ele irá quando sair daqui? — perguntou Abby, num fio de voz.
   — Ted não vai embora daqui. Nunca partirá, a não ser que algo muito sério aconteça.
   A velha senhora encarou Abby por alguns minutos, sem nada dizer. Ela parecia ter dificuldade para encontrar as palavras certas.
   — Bem... meu sobrinho teve um ano difícil. Logicamente, não vai lhe contar isso, mas foi o motivo que o levou a aceitar esse trabalho, a fim de ganhar algum dinheiro extra. Ele não levou uma vida fácil, mas jamais sairá desta casa, porque é seu lar.
   Kate esperou pela reação da jovem, mas Abby apenas sorriu, demonstrando compaixão pelos problemas de Ted, Finalmente, perdeu a paciência e decidiu ser mais clara.
   — A casa é dele, Abigail. Nunca foi minha. Ted guardou cada centavo que ganhou nos rodeios para realizar seu sonho... o sonho dele e de Billy. A fazenda pertence a meu sobrinho.
   — Mas... ele me disse que trabalhava para você! Chama-a de... patroa!
   — Pois estou pronta a entregar esse cargo à mulher certa — disse Kate, rindo.
   — Então, por que ele não me contou?
   — Que é o dono da fazenda? — Kate suspirou. — Sabe Deus! Talvez por orgulho, não tenho idéia...
   — Orgulho?
   — Como já lhe disse, foi um ano muito difícil. Quem sabe o que Ted está pensando? Pode ter medo de ficar sem suas terras ou de perder você. Meu sobrinho não fala muito, nem de seus problemas, nem de seus sonhos. Entretanto, é livre e não errante, e sempre desejou um lar.
   — Eu também — murmurou Abby. — Um lar com um marido dentro dele e muitos filhos.
   — Contou isso a Ted?
   — Nós conversávamos sobre nossos sonhos...
   Abby jamais confessaria que nunca havia falado sobre esse sonho em especial com Ted. Afinal, ela também tinha sua parcela de orgulho!
   — Ted é incapaz de fingir e... lhe deu seu coração, Abigail. Eu tenho certeza.
   — Ele nunca disse que me amava.
   — Às vezes, os homens não sabem dizer as palavras certas. Não estou sugerindo que um relacionamento seja fácil. Vocês dois vêm de mundos diferentes e terão de trabalhar duro para se entenderem... mas vale a pena! Um amor de verdade merece a dedicação de uma vida inteira. Acredite em mim. Se amarem um ao outro o bastante...
   — E quanto é o bastante, Kate? Alguém já conseguiu responder a esta pergunta?
   — Você gosta desta casa... realmente?
   — Gosto muito.
   — Então, conte a Ted. Conte quando lhe disser... — a velha: senhora sorriu maliciosamente — que lhe dei permissão para | tirar fotos nesta sala.
  
  
   CAPÍTULO V
  
   Na verdade, a idéia fora sua e a considerara realmente boa, até aquele momento. Abby estava se sentindo muito desconfortável ao ver os dois concretizarem o que ela colocara no papel. Ted e Gayle já haviam trocado duas vezes de roupas, para fotos diferentes, antes de ela sair e ir para a cozinha tomar um copo d'água gelada.
   — Estão tirando as fotos românticas na frente da lareira — explicou ela a Kate, que preparava mais café. — Não agüento mais o calor.
   — O fogo está aceso? — perguntou a velha senhora, rindo.
   — Claro! A lareira está crepitando.
   — Eu me referia a... seu fogo, srta. Abigail! Percebo que está sentindo calor demais.
   — Bem... — Abby fez uma careta de irritação. — Essa Gayle adora provocar todos os homens!
   — Ela é muito bonita. — A expressão de Kate era de desdém. — Trata-se de uma modelo e não poderia ser feia nem... puritana!
   — Realmente, eu só a contratei porque era linda.
   — Eu não entendo isso. Você também é muito bonita. Por que não serviu de modelo para suas próprias criações? Seria ainda mais interessante, não acha?
   — A câmera me odeia, Kate. Aliás, o sentimento é recíproco, e sempre saio horrível nas fotos.
   — Eu também as detesto, mas sou velha e... Jackie escancarou a porta e interrompeu Kate.
   — Preciso urgentemente de sua opinião, Abby! — Ela estava rubra, de calor e de raiva. — Na verdade, quero que me apóie. A senhora também poderia ajudar, tia Kate. Ted está criando problemas, porque não quer que fotografemos seu peito musculoso!
   Parado no meio da sala, Ted parecia a criatura mais infeliz na face da terra. Estava usando pijama de seda azul, com um laço de cowboy circundando suas iniciais, bordadas no bolso da camisa, e era uma visão de tirar o sono de qualquer mulher.
   Ele viu as três saírem da cozinha e as fitou com uma expressão que as alertava a não o provocarem mais. O olhar severo se dirigia a Kate e a Abby, em especial.
   — Fiquem fora disso, está bem? Voltem para a cozinha e tentem descobrir para que servem todas aquelas panelas! É lá o lugar de vocês duas!
   — Esse homem machista acaba de resolver o problema por mim, Jackie! — explodiu Abby, ofendida. — Seja lá o que for... estamos de seu lado!
   — E eu não quero nem saber quem você arregimentou para se fortalecer contra mim, dona Jackie! Não tiro fotos nu em pêlo, você me entendeu? — Enfurecido, Ted fechou a camisa, deixando abertos apenas os dois últimos botões. — Já é horrível assim, e não vou ceder nem mais um milímetro.
   — Mas é evidente que você tira a camisa... ocasionalmente, Ted — falou Gayle, enrodilhada no sofá e com as magníficas e longas pernas bem à mostra. — Seu bronzeado está maravilhoso!
   — Eu trabalho ao ar livre e, quando está muito quente e não há muita gente por perto, é claro que tiro a camisa. Também tirei o chapéu algumas vezes, nesses últimos dias, mas só para deixar vocês mais satisfeitos. Portanto... basta! Ficar nu não faz parte do contrato que assinei e recuso-me a concordar com essa foto em especial. Além do mais, mal conheço essa mulher!
   Abby olhou para Jackie, sem disfarçar a perplexidade.
   — Afinal... o que está acontecendo?
   — Nós achamos que seria uma foto charmosa se Gayle usasse a camisa do pijama e Ted apenas a calça.
   — Charmosa? — Abby examinou os dois, com um olhar desprovido de emoção. Tentou ser apenas uma desenhista de moda que queria valorizar sua coleção. — É... seria mesmo charmosa.
   — Pois então... você tira essa foto comigo! — exclamou Ted, desafiando-a.
   — Oh, que tolice! — Abby riu. — Se eu fosse a modelo, a foto nada teria de charmosa.
   — Mas eu só participo se você for a modelo — insistiu Ted, sem desviar os olhos dela.
   — Ora, não seja ridículo! — O olhar de Abby não refletia nem um pouco do humor revelado por ele. — É um absurdo!
   — Ridículo e absurdo é esse pijama. Eu me sinto profundamente humilhado em ser fotografado com essa roupa que nenhum homem de verdade se conformaria em usar. Agora... dividi-la com uma mulher a quem mal conheço chega às raias da indecência. Não concorda comigo, tia Kate?
   Mas Kate não respondeu, pois o fitava, boquiaberta e sem fala.
   — Estão vendo? Fui criado de uma maneira muito puritana e... sinto muito, mas não vai dar!
   — Tom e Jackie não estão pedindo para você ir para a cama com Gayle — insistiu Abby, indo contra seus próprios instintos.
   Algo lhe dizia para pôr um fim naquele impasse e sem perda de tempo. Havia muitas pessoas na sala, a maioria delas com uma expressão suspeita, como se estivessem prestes a ter um ataque de riso. Ela não pretendia ser o alvo das gargalhadas!
   — Para falar a verdade... — interferiu Jackie, com o ar decidido de sempre — achamos que uma cena na cama atrairia bastante atenção para nosso catálogo.
   — Viu só? A situação só está piorando! — Afastando-se da lareira, Ted aproximou-se de Abby. Seu tom de voz se tornou um murmúrio confidencial. — Eles pretendem me colocar na cama com outra mulher. É o que você quer, srta. Abigail?
   — Bem... acho que não precisamos de tantas fotos picantes, mas seria interessante. Talvez Jackie tenha razão, não sei...
   — Como já disse, eu concordo com qualquer foto, se você for a modelo. Recuso-me a participar com outra mulher. E ponto final.
   Ted cruzou os braços, indicando que não mudaria de opinião em hipótese alguma, a não ser a que mencionara.
   Após alguns minutos de silêncio, Jackie se recuperou, voltando ao ataque, dessa vez em outra frente.
  
   — As fotos ficariam tão sensuais, Abby! Nosso catálogo se tornaria uma obra de arte e talvez até um exemplo de perfeição para as outras confecções. — Jackie insistiu, num tom convincente: — E você é perfeita para o papel.
   —Eu não lhe disse que você poderia ser uma modelo? — interferiu Kate, rindo maliciosamente.
   Abby estava se sentindo acuada, mas os olhos azuis de Ted a provocavam, desafiando-a a aceitar aquela aventura.
   — Está bem!
   Todos a fitaram de olhos arregalados. A sala ficou em silêncio absoluto, e só se ouvia o estalar das achas na lareira.
   — Afinal, não é nada tão difícil assim, certo? — Ela olhou para todos os presentes, ignorando olhares maliciosos e sorrisos triunfantes. — Não tenho dúvida de que as fotos ficarão imprestáveis, mas não custa tentar. Podem me dar a camisa do pijama!
   Naquele momento de vitória total, Ted não sentiu o menor constrangimento em ficar com o peito nu, apesar da platéia reunida na sala.
   — Você tem certeza de que é o maior tamanho? — perguntou Abby a Jackie, enquanto examinava a peça de roupa. — Estou achando curta demais para cobrir... minhas pernas.
   — É comprida o bastante — falou Ted, rindo. — Kate? Poderia levá-la a meu...
   — Ao seu banheiro? Acho melhor mesmo! Gayle espalhou toda sua maquiagem no meu e está uma verdadeira bagunça.
   — Por que não usa minhas pinturas? — gritou Gayle, enquanto Abby saía da sala.
   Abby não respondeu, pois acabara de entrar no banheiro de Ted e sentia-se profundamente perturbada. Aceitara um desafio que a exporia diante de muitas pessoas. Tirar fotos seminua, ao lado de um homem, parecia-lhe um ato de intimidade reservado apenas aos dois envolvidos.
   .— Que situação absurda — resmungou ela, enquanto dobrava as mangas do pijama, diante do espelho do banheiro.
   Então, ela retornou à sala e decidiu mostrar aos outros que não ignorava os pensamentos de todos.
   — É realmente ridículo!
   — Eu já disse isso... várias vezes — disse Ted, sem disfarçar que estava se divertindo muito com a situação.
   — Vamos tirar apenas duas fotos junto da lareira — explicou Tom, ansioso por começar o trabalho. — As outras serão no quarto. Que tipo de camas existem nesta casa?
   — Ted tem uma enorme — apressou-se a informar Kate. — É só me dar alguns minutos e porei tudo em ordem.
   — Não será preciso, tia Kate. O quarto está arrumado.
   O sorriso de Ted parecia afastar o aspecto de farsa cômica daquela situação. Abby foi para junto dele, um pouco mais à vontade.
   — Você fica muito bem com. camisa de pijama, srta. Abigail. Sou capaz até de mudar de idéia a respeito dessa ridícula roupa de dormir.
   Tom andava em torno dos dois, como um animal predador, prestes a agarrar sua presa, enquanto procurava o ângulo mais interessante.
   — Tive uma idéia! Vamos criar uma pequena história em torno dessas fotos. Vocês estão envolvidos emocionalmente e apaixonados. Tentem agir como se fossem pessoas nessa situação. Ao lado da lareira, o ambiente é de seriedade. Quero que se olhem nos olhos.
   Abby começou a perder a coragem de continuar, mas Tom estava empolgado.
   — É evidente que concordou em ir para a cama com ele, Abby. Mostre quanto está apaixonada. Esse homem é seu príncipe encantado.
   — Ele é um cowboy — resmungou Abby, sem desviar o olhar de Ted. A lareira estava muito quente, mas ela se derreteria antes com o calor daqueles olhos azuis!
   — Ótimo! Ele é o homem de seus sonhos! Perfeito!
   Durante alguns segundos, ouvia-se apenas o som da máquina fotográfica de Tom, que parecia uma metralhadora, tirando dezenas de fotos.
   — E agora... para o quarto!
   Como se seguissem um general, os participantes da equipe seguiram Tom. Ted e Abby foram os últimos a sair da sala.
   — Ele está se empolgando demais — reclamou Ted.
   — Tora é um artista frustrado.
   — E eu não tenho nada a ver com o problema dele! Apesar de estonteado com as ordens sucessivas do fotógrafo,
   Ted sentiu-se completamente à vontade no quarto, com Abby sentada sobre um de seus joelhos.
   — Agora, vocês podem conversar, sussurrando, enquanto executo meu trabalho, amigos! Mas escolham um assunto que faça seus olhos brilharem de emoção. Relaxem...
   Ted passou um braço em torno da cintura de Abby, e ela também o abraçou, recebendo palavras de aprovação da parte de Tom.
   — Onde encontrou esse sujeito doido?
   — Repito que Tom é um artista e o melhor fotógrafo de moda do momento.
   — Lógico! Só o melhor serve para a srta. Abigail. — A mão de Ted acariciava a cintura de Abby. — O que você quer de presente de Natal, moça bonita?
   — Um cavalo. Já pedi esse presente várias vezes e nunca consegui ganhar.
   — Por que não pede uma boneca? Afinal, você não tem lugar para colocar um cavalo.
   Tom girava em torno deles, tirando fotos de todos os ângulos possíveis. Envolvidos pela seriedade daquele profissional, os dois entraram no jogo, sentindo-se isolados do resto do mundo e realmente prestes a ir para a cama juntos. Abby quase se derretia com o calor da paixão refletida pelos olhos de Ted.
   — Estou adorando ser modelo, com você como parceira — murmurou ele. — Afinal, um cowboy tem sempre que estar de prontidão diante de qualquer aventura.
   — E você está?
   — Sabe muito bem que estou, srta. Abigail. — Ted inclinou-se e roçou os lábios na orelha de Abby. — O problema é que, se você se levantar depressa demais, todos perceberão meu estado de... prontidão.
   A voz de Tom, bastante baixa, interrompeu o devaneio dos dois.
   — O filme acabou, mas posso colocar outro e...
   — Acho que já temos fotos suficientes — disse Abby, sem retirar os braços que passara em torno do pescoço de Ted.
   Na verdade, ela não conseguiria afastar-se, pois Ted não pretendia deixá-la sair de seu colo.
   — Então, vamos encerrar a sessão de hoje — falou Tom, recuando em direção à porta. — Fizeram um ótimo trabalho. Vai adorar as fotos, Abby. Talvez queira até iniciar uma nova carreira.
   Os dois ouviram a porta se fechar.
   — Esse rapaz é bem esperto, srta. Abigail. Ele não precisa de palavras para entender uma situação delicada.
   Embora percebesse que Ted estava excitado e a desejava naquele momento, Abby tinha outras intenções, bem mais sérias.
   — Então, você dorme no quarto principal da casa! Por que não me contou a verdade, Ted? Qual é o problema?
   — Não existe nenhum problema...
   Abby levantou-se do colo dele e sentou-se na cama.
   — Agora é dono de uma fazenda. E, no entanto, fingiu que continuava sendo um cowboy errante.
   — Foi você quem tirou a conclusão errada, Abby. Achou que eu trabalhava para alguém. Mas agora... cuido de minhas terras.
   — E escolheu um lugar lindo.
   Abby tentou ignorar quanto se sentia magoada com a mentira de Ted. Talvez tivesse lhe ocultado a verdade por orgulho, mas lhe parecia ser apenas falta de confiança nela.
   — E um negócio arriscado, Abby. Mais perigoso até do que participar de rodeios.
   — Impossível! Eu quase morria do coração quando o via montar um daqueles potros indomados. Oito segundos me pareciam uma eternidade.
   — Uma tempestade de neve também parece durar uma eternidade. Entretanto, é o que eu quero da vida... o que sempre quis.
   — Estou feliz por ter conseguido realizar seu sonho secreto, Ted. Você nunca comentou nada comigo. — Ela fitou as próprias mãos, perturbada. — Vou partir no final da semana.
   — Tão depressa?
   — Já terei terminado o que vim fazer por aqui.
   — Então... só nos restam três dias?
   — Exatamente. Apenas três dias. — Com muita relutância, ela ficou em pé. — Deixei minhas roupas no banheiro.
   — Precisa de ajuda?
   — Posso me virar sozinha. — Ela deu um sorriso triste. —E você?
  
  
   O olhar de Ted refletia tanto desejo que Abby não teve forças para resistir ao convite. Deixou-se levar pelas mãos dele e entregou os lábios aos beijos que a enlouqueciam de prazer. Ele a cobriu com seu corpo musculoso e apenas a seda macia impedia suas peles de se tocarem. Abby arqueava-se, desejando saciar a paixão que parecia nunca se extinguir.
   Ted não resistia ao desejo de possuí-la, pela primeira vez, em sua cama. Queria amá-la com toda a paixão existente em seu íntimo, dia após dia, por toda uma vida. Por que não conseguia colocar esses sentimentos em palavras? Por que temia tanto arriscar-se a ouvir novamente que ela não podia viver daquela maneira?
   Entretanto, era possível demonstrar seu amor por meio de atos. Amava-a com todas as partes de seu corpo, e, quando Abby partisse, levaria com ela a certeza de que nunca seria amada com tanta intensidade.
   Mas Abby não ia partir naquele momento. Ela ficou em seus braços por muito tempo, até as sombras do crepúsculo invadirem o quarto. Quanto mais a prendia em seus braços, mais compreendia quanto ela significava em sua vida. Encontrara a mulher ideal, a única a quem amaria e que não pertencia a seu mundo.
   — Preciso ir — murmurou ela. — Ainda tenho uma série de detalhes a completar e...
   — Você é sócia da loja em Rapid City, certo? — perguntou Ted, conformado em se resignar a ocasionais momentos de amor. — Então, vai vir à cidade de vez em quando, não é?
   — Se houver necessidade... Jackie teve a idéia de abrir esta loja, porque nasceu aqui e sua família ainda mora na região. — Abby suspirou. — Não creio que vá precisar muito de minha ajuda.
   — Quando vier... promete que telefonará para mim?
   — Claro.
   — Não tenho mais motivos que me levem a Denver e, para falar a verdade, não sinto falta de passar alguns dias em uma cidade grande. Mas vou morrer de saudade de você, sabia? Passei dez anos assim...
   — Verdade? Eu teria jurado que você me amou... no passado.
   — Pensei que tivesse amado — brincou ele, repetindo as mesmas palavras de Abby, à beira do lago. — Sinto muito, querida. Admito que eu não era um exemplo de homem ideal naqueles dias distantes, mas melhorei bastante, princesa.
   — Eu não sou nenhuma princesa! — Enfurecida, ela repetira a palavra como se fosse um insulto. — Não sou igual a sua mãe, Ted!
   Ele a fitou, confuso, sem saber de onde Abby tirara aquela idéia.
   — Eu não a comparei com você. Droga! Nem sei como ela era!
   — E também não sabe como eu sou! — explodiu Abby, afastando-se dele e sentando-se na cama. — O pior é que se recusa a descobrir. Não quer correr o risco de ferir seu precioso orgulho de cowboy, que guarda como se fosse um grande tesouro!
   — Quer que eu corra atrás de você quando for embora da cidade? É isso que deseja? — Ele também se sentou na cama. — Eu até que seria capaz... Há dez anos, quase cheguei a esse ponto, e agora, quem sabe?
   — Tome uma atitude agora, Ted!
   — Você ainda não partiu.
   — É... ainda estou aqui. E isso quer dizer que ainda tem ?uma chance de me segurar a seu lado.
   Com gestos bruscos e raivosos, Abby vestiu a camisa do pijama e levantou-se. Ted estendeu a mão, mas esperava que ela completasse seu gesto, e cada um deles percorresse metade do caminho.
   Abby o ignorou, afastando-se da cama, em direção à porta.
   — Você tem medo de se sentir muito próximo da alma de uma mulher? É isso que o apavora? — Ela parou no meio do quarto. — O que realmente faria se me segurasse aqui, Ted?
   — Eu a manteria a meu lado. — Ele voltou a se deitar. — Guardaria você em meus sonhos. A vida real é muito diferente de nossas fantasias, Abby. Não funciona dessa maneira, e, por esse motivo, só desejo o que posso fazer acontecer.
   — Então, tudo depende de você, certo?
   — Fiz acontecer o campeonato e esta fazenda. Mas você...
   — Qual é o problema comigo? Não sou um mito nem uma fantasia da sua imaginação. Sou real! Não quer ter filhos?
   — Claro que quero. Algum dia...
   — Ah! Em algum dia de um futuro distante, no qual só existirá felicidade, acertei? Pois eu também quero, sabia? — Abby lutava contra as lágrimas, enquanto abotoava a camisa do pijama. — Você nunca me perguntou, mas é um de meus sonhos mais preciosos.
   — Pretendo ter filhos, Abby. Quando a situação da fazenda estiver mais estável e eu puder sustentar uma família.
   — Mas eu amo você agora — insistiu ela, com a voz angustiada.
   — Então, continue aqui, enquanto durar seu amor.
   — Suponho que esteja me pedindo bem pouco. E quem faz assim, recebe menos ainda. Eu sou diferente. Por que pedir uma boneca, quando se deseja um cavalo?
   — Mas se você não tem lugar para colocar um cavalo... de que adianta pedir?
   — Você tem razão! Eu desejo algo que não posso fazer acontecer, certo? A realização de meu sonho não está apenas em minhas mãos.
   Ted foi até a casa de Abby no dia em que ela fizera as malas para deixar a cidade. Vendo toda a bagagem enfileirada ao lado do sofá, ele foi direto ao assunto.
   — Eu vim para lhe dizer, caso não tenha notado, que a amo muito. — Ele riu, pouco à vontade. — Parece que a amei por toda minha vida.
   — Entre, Ted.
   Abby não queria se entusiasmar com as palavras dele, porque sabia que não levariam a nada, e só lhe restaria mais sofrimento.
   — Eu... eu tenho que lhe explicar algo e...
   Retirando as sacolas que colocara sobre o sofá, Abby sentou-se, sentindo as pernas trêmulas demais para se manter em pé.
   — Na verdade, eu não quero, mas preciso explicar. Sei que é um sucesso em sua carreira, e sua fama continuará a crescer. Minha situação não tem nada de parecido com a sua. O inverno foi duro, perdi muitos bezerros e algumas vacas procriadoras. Minhas finanças ficaram bastante precárias...
   — Está a ponto de falir?
   — Não é tão grave assim. Entretanto, não seria o bastante para sustentar...                                    
   — Eu não preciso ser sustentada por ninguém!
   — Mas eu gostaria, ao menos, de sentir que tenho condições de sustentar minha esposa. Sei que não gosta de ser chamada de princesa, mas é como a vejo.
   — Odeio que me chame assim!
   — Meu pai se referia a minha mãe dessa forma, porque acreditava que ela fosse realmente a princesa inatingível dos contos de fadas. Ele nunca deixou de amá-la, mas a perdeu, e eu nunca soube por que não deu certo para eles.
   — Eu gostaria de ter conhecido seu pai. — Abby tocou o braço de Ted e sorriu docemente. - Mas acho que conheci parte dele em você, certo?
   — É nós sempre fomos parecidos. - Ele respirou fundo, criando coragem para dar o grande passo. - Não quero que vá embora, Abby.                      
   — E o que pretende fazer para conseguir que eu fique. O que você realmente quer?
   — Eu já lhe disse. Quero que fique comigo.
   — Fiquei há dez anos e ainda estou aqui, agora.
   — Para sempre, Abby! Será que ainda não entendeu?
   — Basta me pedir, Ted. Ponha seu orgulho de lado e se arrisque de levar adiante um relacionamento. Somos diferentes e vivemos em mundos opostos.
   — Sempre se encontra um caminho quando existe amor, eu juro que te amo muito.
   Ele a tomou nos braços, incapaz de resistir mais.
   — Você quer se casar comigo, Abby? Não tente me enganar. Se me aceitar, será para sempre.                                        
   — Eu jamais o enganarei... se sua proposta for realmente seria
   — Claro que é! O que mais preciso fazer para convencê-la.
   — Que tal um pedido formal, como acontece nos romances de amor?                                                          
   — Céus! Eu não acredito no que está acontecendo comigo! Tirando o chapéu, Ted ajoelhou-se na frente de Abby e segurou-lhe as mãos.
   — Estou lhe pedindo, com toda a humildade de que sou capaz... por favor, aceita casar-se comigo, srta. Abigail.
   — Sem dúvida nenhuma, Ted Lassiter.
   — Então... será que pode me ajudar a sair dessa posição infeliz? Meu joelho é um desastre!
   Após alguns meses, Abby conseguiu ganhar o cavalo com que tanto sonhara e também o lugar onde o animal seria mantido. No final desse mesmo ano, havia uma aliança de casamento em seu dedo, e, nove meses depois, começou a lançar sua nova linha de roupas infantis.
   Ted Lassiter Júnior foi seu primeiro modelo.
  
   FIM